Jiló Verdinho
 
     Meu avô cantarolava uma música da qual só recordo uns versos. Seria fácil buscar por aí o resto da canção, mas prefiro ficar só com a parte que, saudosamente, lembro dele a cantar:
"Saudade, bichinha danada, que em mim fez morada, e não quer se mudar. Tem gosto de jiló verdinho, plantado na lua nova do penar".
     Eu, que não aprecio jiló por seu sabor amargo, pensei no verdinho e fiquei a imaginar uma cor para a saudade que, algumas vezes, também não é um sentimento apreciável. Que cor teria essa bichinha danada quando lhe surge uma oportunidade de em alguém fazer morada?
     E brinquei com as possibilidades: Saudade teria a (óbvia) cor Preta quando fizesse parte do luto por alguém que morreu. Mas há também o luto da saudade por alguém que morreu sem ter morrido de fato, então ela poderia ter a cor Roxa, que fica num meio termo.
     Poderia ser Cor-de-rosa, quando do beijo de despedida da pessoa amada até o próximo encontro, ou Cor-de-rosa-choque, quando da lembrança dos seus momentos de sedução ou de paixão intensa.
     A saudade poderia ter a cor Azul clarinho, como aquela nostalgia de um bom tempo vivido, ou ter a cor Cinza, quando esse tempo vivido foi ruim.
     Poderia ser amarronzada quando fosse por um passado distante, alaranjada como no tempo presente.
     Saudade também poderia ter a cor Branca quando lembrada a pureza da infância, e Vermelha quando pensada como cor da juventude vibrante.
     Então volto ao sabor amargo do jiló verdinho. Não me agrada muito a analogia, mas como não pensar no Verde como a cor da “saudade do que ainda não vivemos” - já que é impossível saber se o iremos viver? No específico caso, sendo esta uma dúvida amarga, a saudade se transformaria noutro nome e se assumiria num clichê: Esperança.
Marise Castro
Enviado por Marise Castro em 30/04/2020
Reeditado em 21/07/2020
Código do texto: T6932773
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