"The Game"

Gosto de escrever e escrevo muito! Creio que na maioria das vezes me expresso melhor assim do que falando. Aos 36 anos, percebi que muita coisa na minha vida mudou, não sei dizer se algumas mudaram para pior ou melhor, o fato é que são conseqüências das minhas experiências. Experiências boas ou más! Ao lidar com as com as conseqüências é que ficará definido o resultado final.

Nessa reconstrução constante do ser, tudo funciona como numa peça de teatro, tem a trama principal, com seus atores, figurantes, cenários e por fim o público. Figurinos prontos e diálogos conduzem o desenrolar da estória. Tudo interage constantemente. O certo é que mesmo que pensemos conhecer o fim, isso só será confirmado no descer das cortinas, pois até lá tudo pode ser modificado. Assim também acontece comigo, sou uma peça em cartaz por tempo indefinido. Personagem principal “EU”, mas como “EU” sou uma obra inacabada, os ensaios das cenas vão mudando seu curso.

Vou me esforçar para ser mais clara. Digamos que inicialmente buscava apenas ter o elenco ideal para estar no palco junto a mim, trocando deixas, às vezes monólogos e também silêncios. No primeiro ato, mostro apenas um pouco de mim, minha individualidade e algo do que já passei para chegar até aqui. Mas no palco da minha vida sei que estou só, olhando para a platéia que espera de mim alguma reação. Tudo que estava na mente desapareceu, sumiu, como costumam dizer: “deu branco”. E na minha fragilidade feminina, dei tempo para que eles tomassem uma atitude antes de mim. Expectativas não atendidas geram vaias, muitas vaias, um barulho ensurdecedor. Diria que ainda que tampasse meus ouvidos não conseguiria abafar o som. E mesmo assim, vendo as expressões nos rostos deles, bastaria para que eu entendesse o que queriam dizer. Os coadjuvantes inquietos tentando evitar o seu próprio fracasso improvisaram algo para disfarçar, se saíram tão bem quanto artistas profissionais. Situação controlada, e conseguimos passar ao segundo ato. Foi assim que inadvertidamente que mordi a maçã envenenada.

Nos camarins, o escolhido para ser meu par romântico, demonstrou todo seu apoio, me fez mil declarações de amor, com promessas de um conto de fadas. Apesar de escrever e desejar um conto de fadas, não acreditava que pudesse acontecer comigo! Foi tão inesperado que fiz de conta não valorizar a fantástica possibilidade de ser feliz. Mas que tipo de louca seria ao recusar uma parceria que poderia vir a ser um sucesso? Agora mais confiante, subi novamente ao palco. A platéia silenciou e estava diante de mim com tantas indagações em seus olhares, que eu fiquei sem respostas, novamente paralisei. Inação o público não perdoa, contudo, lembrei que já não estava mais só, pensei! Bastou um olhar e passei a vez à aquele que devia ser o coadjuvante. Ele, com seu instinto protetor roubou a cena, tomou conta do espetáculo e me conduziu por onde quis. Ainda que relutasse em ouvir seus sussurros, meu coração de mulher desejava ser amada. Mal sabia que a partir daquele momento a peça se tornara um jogo, cujas regras me eram “sugeridas”. Não mais tinha domínio do roteiro. O roteiro tinha vida própria. A platéia permanecia imóvel a espera do final! Atenta a alguma dica, com a qual pudessem presumir como acabaria.

No lugar das vaias, surge à tensão, a ansiedade, novas expectativas. Dias, semanas e meses tornavam evidentes um final feliz, afinal contos de fadas sempre têm finais felizes! Os coadjuvantes atuavam com tal cumplicidade, que acreditei fazer parte de algo realmente muito bom para todos, ou melhor, eram atitudes altruístas, o faziam pensando em mim. Desempenharam seu papel com tanta veracidade, que as cenas foram se encaixando como mágica. Relaxei. Deixei de me preocupar tanto. Adaptei-me acreditando não ser um jogo, onde o azar poderia ser cogitado. Ledo engano, todos os jogos são de sorte e azar, como de vencedores e vencidos. Vencedor apenas um, vencidos vários. Mas esse jogo era de dupla, estava claro para mim, ainda que perdesse, não estaria só. Adivinha? Novo engano, eu é que jogava por dois, meu parceiro de cena jogava apenas por si. Descobri no último ato, que meu maior erro foi deixar que ele roubasse a cena. Como se naquele instante tivesse dado carta-branca, para que ele levasse meu coração, minha alma, minha cega confiança. Final de espetáculo, entre sinais e deixas fui deixada atrás das cortinas. E ele recebeu junto aos seus, os aplausos entusiasmados da platéia. Fim de temporada: só para mim!

Um ator que deixa de atuar, deixa viver. Não quero deixar de viver, mas não quero mais jogar, nem fazer parte de duplas. Quero ter um par. Essa é minha vontade real e profunda. Mas se o roteirista Maior, lá de cima, me encaminhar para um monólogo: paciência! Ainda que só em nova temporada, ocupo-me com novo cenário, produção e um novo teatro para a apresentação. Com certeza, que agora mais experiente não cometeria os mesmos erros, faço modificações ao roteiro de acordo com o bom senso e meus desejos, é claro. E eu desejo não ter diferenças, escolho as igualdades. Desejo não blefar e sim compreender a sinceridade ainda que ela não me agrade. Desejo não fingir, prefiro agir fiel a mim mesma. Desejo não me preocupar em agradar, mas agradar pelo que sou. Desejo ter o benefício da dúvida, não quero ter cegueira amorosa. Desejo não pertencer a ninguém, o ideal seria somar, multiplicar, mas se houver divisão, que eu preserve algo de mim. Desejo viver para aprender e não ter que esquecer para viver. Desejo apenas um par.