Amor: uma questão de vulnerabilidade

"Ao amar a mim mesma, ganhei coragem para me mostrar e ficar vulnerável de maneiras novas, e é disso que trata o amor."

Uau! "A coragem de ser imperfeito", definitivamente, foi a descoberta literária perfeita para a quarentena. Chegou no momento em que eu precisava, e esse livro incrível acabou meu marca-texto. Numa reflexão profunda sobre vergonha, seus mecanismos, impactos e como vencê-la, Brené Brown me fez ver a vergonha sob um outro prisma, e vem trazendo insights importantes sobre como esse devastador e inútil sentimento estava presente na minha vida.

Nesse trecho do livro, fala, especificamente, sobre como ela nunca entendeu bem porque tanta gente nas pesquisas dela falava que amar a si mesmo ajuda a amar outra pessoa. A autora conta (uma página atrás XD) que nunca curtiu essa idéia. Eu também nunca curti essa idéia. Aliás, sempre achei estranho quando amigos e psicólogos me diziam que eu deveria ser a minha prioridade, e que, primeiro, você precisa amar a si, e depois, o outro. Para mim, uma relação ideal é aquela em que ambos se amam igualmente. Ou seja: você ama a outra pessoa tanto quanto a si mesmo. A idéia de se colocar acima sempre me pareceu egoísta.

Mas, fugindo um pouco do livro, tudo passou a ser diferente quando entendi um lance empírico da vida: muitas das pessoas com as quais vamos nos relacionar se colocam em primeiro lugar. E colocam você em segundo. Se você chegar num relacionamento mais disposto a dar do que a receber, e seu par for alguém mais disposto a receber do que a dar, essa matemática gerará um prejuízo que recairá, principalmente, sob as suas costas. Por ser bem intencionado, pode acabar amando mais o outro do que a si próprio (e isso é até biblicamente errado. Com todo respeito às religiões, veja aí o peso dessa recomendação, feita por, tipo, Deus: "amar ao próximo como a ti mesmo". Nem menos, nem mais.).

Num mundo onde nossos pares já se priorizam a despeito do que a gente pense, pode ser bem difícil dar um amor na justa medida. É como o jogo da sedução: eu detesto jogos, mas o empirismo tá aí pra nos mostrar que todo mundo joga, então a saída é jogar limpo. Isso me fez perceber, que, num relacionamento, essa é uma necessidade importante a ser preenchida para mim, num parceiro de vida: disposição para amar infinitamente, como se ambos fossem (e são) igualmente importantes um para o outro, detentores dos mesmos direitos, inspiradores dos mesmos cuidados. Até me atrevo: eu daria minha vida por ele(a), e ele(a) por mim. Mas a gente vive num mundo onde geralmente o outro se prioriza. Se o outro se prioriza, tudo bem de vez em quando eu me priorizar também.

Mas, é isso que a autora está dizendo? Não. Essa foi uma interpretação minha. Na verdade, ela está dizendo algo muito interessante: a partir do momento em que nos amamos o suficiente, começamos a crer que não é um pecado original expor nossa vulnerabilidade. Achamos que somos dignos de poder mostrar/falar nossos pontos fracos, medos e dúvidas sem nos tornarmos dignos de pena/abandono/riso/inadequação/ressentimento, etc. E aí, às vezes, a mágica acontece: você foi sincero, abriu-se, disse uma coisa que seu(a) amante precisava saber, trouxe um problema à tona de forma delicada, ficou disponível. Claro que isso não se trata de uma DR interminável ou de ficar analisando relação, dar uma de psicologo, ser prolixo e viver "moendo" sentimentos. É, na verdade, sobre jogar a real (e uma real importante), para quem é interessado(a) no assunto e conquistou o direito de ouvir.

Algum tempo atrás, minha então professora de yoga publicou um post em rede social sobre relacionamentos. Continha, basicamente, uma foto dela, sorrindo, e a legenda: "você deixará seus medos para dançar comigo?". Imagina, então, se você, carinhosamente, pudesse dizer qual é o medo. A pessoa estaria tão mais próxima, que aumentaria muito a chance desse casal dançar.

Jéssica Callou
Enviado por Jéssica Callou em 07/05/2020
Reeditado em 08/05/2020
Código do texto: T6939894
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