UM POUCO DE JAPÃO - PARTE IV (cont. 1)

O artista japonês, YOSHITO OHNO, fundador do "butô", morto aos 81 anos, fala da dança que confunde a prática filosófica e espiritual. Era o último remanescente do trio de dançarinos que fundou o estilo - os outros eram seu pai, o lendário Kazuo Ohno (1906 / 2010) e Tatsumi Hijikata (1986), considerado o criador do gênero. Conhecido do público brasileiro, apresentou-se com o país pela primeira vez no Brasil em 1986 retornando em 2013 com "Time World" e dois anos depois acrescentando "Antony and theOHNOS", nova criação em parceria com o cantor-compositor Antony Hegarty (hoje de nome Anohni). YOSHITO foi o principal colaborador histórico do pai e de Hjikata - em 1959, este e contracenava com o segundo na obra marco inaugural da dança, "Kinjuki", coreografia a partir do romance homônimo de Mishima, o escritor até frequentou a sala de ensaios e virou grande admirador dos precursores; ao longo de seis semanas, virou 'obediente discípulo' de Kazuo e Yoshito. --- Entre as idas e vindas do palco, Yoshito chegara a abandonar a dança após o primeiro solo em 1969, decepcionado com o resultado da obra, e refez a vida como gerente de uma rede de farmácias. função exercida por 11 anos. Estrondosa participação de Kazuo no Festival de Nancy, França, 1980, levou o "butô" à fama internacional e Yoshito abandonou a farmácia, emagreceu vinte quilos, raspou a cabeça e voltou à cena para sempre - passou a desenvolver um estilo peculiar, de leveza e delicadeza de gestos. --- Desde 2016, reduziu consideravelmente aparições públicas, recluso num estúdio na cidade de Kurosawa, onde transmitia para as novas gerações os fundamentos primordiais que aprendeu. --- Na entrevista em março de 2019, refletiu sobre a vida, a morte e as seis décadas do "butô", uma dança, a seu ver, embora não mais um estilo revolucionário, confunde-se com uma prática filosófica e espiritual, capaz de produzir revoluções individuais e atrair novos entusiastas pelo mundo. --- Em 2019, sessenta anos da estreia de "Kinjuki", primeira reformance do "butô"! Obra de dança moderna, mas a Associação de Dança não recebeu o trabalho, como peça sobre a homossexualidade e enfrentou uma reação homofóbica; depois disso, os integrantes da associação não queriam trabalhar com o grupo por causa do tema que haviam escolhido - desligaram-se da associação, precisavam de um nome para a dança e assim veio o termo "butô". --- "Endurecemos o corpo, surpresos porque a rigidez era oposta ao corpo da dança moderna, já familiarizada e manifestamos ritmos inesperados", disse ele. --- Muitas pessoas foram influenciadas por Kazuo, muitos artistas mesmo com idade avançada, inclusive Antonio Gases retornou aos palcos encorajado pela dança de Pina Busch que foi pessoalmente ao encontro dele. --- O tema recorrente na obra de Kazuo é a preciosidade da vida e serviu ao exército que esteve na guerra durante nove anos: testemunhou muitas mortes entre vida e morte no front. Apresentado em público, o corpo pinatado de branco, era como se declarasse: "Eu sou o morto". Alguém que havia atravessado a morte e o inferno e retornado, no sentido de compreender a necessidade de valorizar a vida em todos os seus aspectos até o final - é disso de que trata o "butô". --- Orar para um mundo sem guerra não é suficiente. Hoje, muitos conflitos no mundo, tempo de transportar o sentido da preciosidade da vida pela arte, é cada vez mais importante.

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FONTE:

"Um artista marcado pela leveza gestos", artigo de Luiz Felipe Reis, jornalista, dramaturgo e diretor teatral - Rio. jornal O GLOBO, 10/1/20.

F I M

Rubemar Alves
Enviado por Rubemar Alves em 23/05/2020
Reeditado em 25/05/2020
Código do texto: T6955654
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