A pauta do momento

Não eram inimigas, mas estavam longe de ser amigas. Cada uma no seu quadrado, afinal, eram muito ocupadas. Com a chegada da pandemia foram obrigadas a se unir, algo como “a união faz a força”.

Pela situação atual de exceção, marcaram um encontro por videoconferência, o assunto era urgente, não podia esperar. As três que eram pautas preferidas do mundo, ficaram reféns da escolha do Povo, que por costume, elegem sempre uma única coisa e defendem a ferro e fogo, se esquecendo de outras igualmente importantes.

Elas: Saúde. Economia e Liberdade.

Mais que nomes, possuíam atribuições, direitos e deveres. Mas as pobres coitadas não tinham autonomia, eram sempre dirigidas por eles, os anfitriões do mundo, os Políticos.

A conversa começou e a Saúde, coitada, desembestou a lamuriar-se:

- Atchim! Basta! Basta! Eles não sabem o que fazem, cada hora é uma desinformação arranjada. Não veem que sou a mais importante? O que seriam sem mim?

A economia por sua vez, sempre muito séria e a mais racional dentre as três, retrucou: - É porque não vê o que estão fazendo comigo! É o caos generalizado. Se eu falir, quem poderá nos acudir? Oras, ninguém está pensando no futuro? Inconsequentes.

A liberdade, irritada por se achar a mais afetada, mas já acostumada a ser desprezada, compartilhou a sua frustração: - Se vocês estão se sentindo ameaçadas, meu destino é ainda mais trágico, as civilizações costumam repetir erros grotescos, não sei o que acontece, de um jeito ou de outro, acabo sempre no meio das bagunças humanas!

Conversaram por horas, tentando chegar a um consenso de quem deveria ser a pauta da vez.

Economia: - Se não tivessem me roubado tanto, hoje não estariam tendo que escolher entre nós. Saúde, pensei que estava tudo certo com você, mas percebo agora que não, onde está o dinheiro do Povo? As contas não tinham sido aprovadas?

Saúde então disparou: - Nem me fale! Aqui está mais para furto. Os desvios são discretos. A culpa, porém, não é minha, é de quem nos governa, se tivessem construído um sistema de saúde efetivo, hoje a situação seria diferente.

Liberdade: - A culpa não é nossa, mas precisamos agir, antes que a liberdade nos seja tomada de vez. Temos o poder da fala. Temos direito ao grito.

Saúde: Mas nos falta fôlego...

Economia: Tenho mais o que fazer do que ficar gritando.

Liberdade: - Entendo a agonia de ambas, por isso temos que reclamar para nós os direitos resguardados, temos uma opção, precisamos chamá-la, só assim valeremos algo, só assim enfrentaremos os déspotas.

Nesse ínterim, a Liberdade cansada da discussão que não levaria a lugar algum, ligou para a Justiça, esta que não era amiga de ninguém. Não podia. Era inerte. Precisava sempre ser provocada.

A Justiça se colocou à disposição, mas não sem antes alertar: - Posso fazer muito, mas não posso fazer tudo, sozinha muito menos, o meu poder é limitado, é preciso chamar também a Cidadania, esta que é deixada de lado, que poucos exercem. O povo precisa exercê-la. É necessário que a mudança comece por nós, de dentro para fora, é assim que deve ser. Sem a Cidadania é impossível atender todas as solicitações feitas por vocês e pelo Povo. Sem o exercício da Cidadania é fácil manipular e controlar vidas.

A Liberdade tomou a frente e finalmente chamou a Cidadania para a conversa:

Cidadania: - Bom, de fato quase não sou lembrada, é raro ver atitudes cidadãs nos povos de hoje em dia, nas eleições, por exemplo, os atos não são praticados em sua plenitude, vocês sabem... os “anfitriões” bagunçam tudo. Vocês deveriam mesmo é chamar a Educação, se há Esperança, é nela que encontrarão.

Liberdade, quase desistindo, pediu um minuto de atenção da Sra. Educação.

Educação: - A ignorância faz um barulho imenso e sempre inútil, mas a sabedoria quando adquirida e compartilhada faz com que as coisas funcionem, mas nunca sozinhas, é preciso ter pessoas com atitudes Cidadãs, com sede de Justiça, com Saúde para combater o mau e que tenham o espírito de Liberdade para reivindicar e fazer o bem. A Economia girando é a consequência das boas ações. Os anfitriões possuem o poder da mudança, mas não estão interessados se isso não aumentar os zeros de suas contas bancárias. Civilizações são uma eterna construção inacabada. Precisamos de anfitriões melhores, e eles se fazem com cidadãos preparados. Em mim está a chave da transformação de uma nação.

Mas a Educação não é a pauta do momento e seus frutos demandam longo prazo, então, no atual cenário não podemos contar com ela. Temos que nos virar sozinhos.

Ingrid Zanini
Enviado por Ingrid Zanini em 05/06/2020
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