Coitadinho do Rubião

Ontem, pela segunda vez, terminei de ler o romance “Quincas Borba”, cujo autor é Machado de Assis. Hoje, vinte e quatro horas, após o término da leitura, comiserado estar o meu coração por causa do triste fim que tomou Rubião.
Eu sei que os leitores devem estar ansiosos para saber quem é esse tal de Rubião. Pois bem, podem ficar tranquilos, falar-vos-ei nesse instante. Esse infeliz é o protagonista do romance acima. Fora surpreendido, ao saber que era o herdeiro universal da fortuna do velho filósofo Quincas Borba, que era precursor da nova filosofia do Humanitismo, filosofia essa, que iria substituir todas as outras, por causa da sua eficácia.
No entanto, deixemos Quincas Borba e o Humanitismo de lado, e voltemos ao que nos interessa, Rubião e sua herança. Sabedor que de uma hora para outra, a vida lhe foi muito generosa, sendo agora detentor não apenas de dez, nem de vinte contos, mas de toda a herança do velho filósofo que girava em torno de trezentos contos. Agora, o provinciano, partia de Barbacena-MG rumo à corte na cidade do Rio de Janeiro para gerir seus bens. Ah antes que eu me esqueça, para que o jovem apossasse de toda essa fortuna, uma única condição foi lhe imposta, que ele cuidasse com todo amor e carinho do cãozinho de Quincas Borba, que herdara o seu nome.
Infelizmente a desgraça de Rubião começar-se-ia já dentro do trem, quando rumava para a corte. Na viagem fica conhecendo o casal Sofia e Cristiano de Almeida e Palha. Todo simplório, Rubião vai revelando o coração e toda a fortuna que acabara de ganhar recentemente. Reconhecendo a ingenuidade do novo abastado, a partir de então Cristiano iniciar-se-ia arquitetar seu plano diabólico. Para que sua trama fosse bem-sucedida, o marido iria contar com a participação da esposa que prontamente iria usar seus dotes sedutores através de um corpo imensamente exuberante.
Cristiano inicialmente se dispôs, sendo um tipo de guia turístico, para aquele provinciano que acabava de chegar na corte. Assim começou a desgraça do pobre Rubião, homem imensamente solícito, portador de um coração infinitamente generoso. Diante desse panorama, parasitas que não iriam faltar para dilapidar a sua fortuna. E o plano de Cristiano fora tão eficaz, que o pobre Rubião terminou ficando perdidamente apaixonado pela esposa daquele que considerava seu melhor amigo. Aí o marido aproveitava pedindo dinheiro emprestado. Ganhou a confiança de Rubião de tal forma, que passou a gerenciar todos os seus bens. Como a situação ficava fácil para o amigo Palha, uma vez que sua esposa tinha hipnotizado Rubião com a sua beleza, acabou propondo uma sociedade numa importadora, Palha e Cia.
Na mansão de Rubião, no bairro Botafogo, o que não faltava era “amigo”: O general querendo desencalhar sua filha quarentona, Carlos Maria, Camacho que tinha um jornal, todos se beneficiavam com a generosidade do Mineiro. A partir de então, a falência de Rubião era questão de tempo.
Ciente que o seu sócio, era muito mão aberta, Palha alegando desculpas, propôs o final da sociedade. Sem saber o real motivo, o provinciano acaba aceitando o fim da sociedade, pois não queria trazer aborrecimentos para o seu amigo. O sujeito não era bobo, a importadora ia de vento em popa, e ele queria abocanhar os lucros sozinhos. Tudo isso foi facilitado, uma vez que Rubião só pensava em Sofia, enchendo a amada de joias preciosíssimas.
Quando o romance estava prestes a terminar, é que foi decretada integralmente a falência de Rubião. Foi aí que meu coração encheu de comiseração pelo pobre infeliz. Agora ele visitava, aqueles mesmos amigos que não saiam de sua casa, todavia, esses amigos não mais o conheciam. Quando viam que ele estava chegando, fechavam as portas, mandavam dizer que não estavam, e o coitado começou a cair a sua ficha, no entanto, agora era tarde, já estava na rua da miséria e da solidão.
Diante de tudo isso, e sendo rejeitado por sua amada, a demência tomou conta. Ficou um bom tempo no manicômio, mas nada disso adiantou. Ele andava falando pelas ruas, e a meninada o seguia fazendo chacotas. Até a criança, que dois anos antes havia sido salva pelo pobre Rubião, fazia parte da súcia. Morreu miserável, na soledade e louco. Que triste fim teve uma alma tão generosa, porém sem maldade alguma.
Apesar de ser apenas um romance, era o retrato da sociedade em que vivemos. Uma sociedade que vive de aparência, interesseira, mesquinha. Que no seu cotidiano, vai passando o rolo compressor numa multidão de Rubiões. Talvez por causa disso, seja a minha maior lástima.
 

 
Simplesmente Gilson
Enviado por Simplesmente Gilson em 08/06/2020
Reeditado em 08/06/2020
Código do texto: T6971052
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