Meu lamento

Essa pandemia veio para dobrar muitos joelhos, abrir olhos e derramar lágrimas, estender as mãos e dividir tristezas. Tenho visto muitas matérias nos telejornais mostrando a cara da miséria. Ela é muito feia e cruel; tem cor, classe social e espaço geográfico.

A minha Bahia é linda; temos muita fé e coragem. Ela é uma mãezona, ama muitos filhos e acolhe muita gente. Mas não tem recursos econômicos para sustentar tanta gente. Aqui, a solidariedade é farta, e a falta de riqueza gera mais pobreza, pois onde come um, dois passam fome.

Desde pequena faço um pouco, entrego o meu melhor, entretanto, sinto que não é suficiente. Quando vejo os casebres, a falta de estrutura básica, a desnutrição e a ignorância, sinto-me engessada. Nesse momento, a vergonha bate-me à face, tenho tanto comparado ao nada deles.

Não sou rica, mas tenho a sensação de que a vida fez-me privilegiada. Muitos anos atrás, entreguei-me aos serviços de cunho sociais, para minimizar os impactos da invisibilidade. Viver à margem da sociedade, com uma transferência de renda e falta de oportunidade socialmente justa, é o mesmo que estar fora do mapa.

Não temos políticas públicas para distribuição de rendas e geração de empregos. O que se tem é migalhas, esmola e uma economia inflacionada por demandas de bolsa-miséria. Moro em Salvador, mas por motivo profissional, vim para Juazeiro. Vejo as pessoas dizendo o quanto é linda essa cidade, então, não estamos falando do mesmo lugar.

São duas cidades vizinhas, Juazeiro-Ba e Petrolina-Pe, a última sim, é organizada, desenvolvida e estruturada. Um IDH de arrumar as malas. Quem mais queria retratar um quadro bonito da região, seria eu. Infelizmente, tenho que fotografar a realidade nua e crua, tal como é. Vilarejos como Salitre e Itaberaba, muitas famílias, não comem há dias.

Sem roupas e acessórios, sem teto, sem reboco, sem saneamento básico e sem asfalto. Falta tudo! Não consegui olhar para os olhos das crianças, pois tenho filhos, e eles têm tanto. Principalmente, muito amor. Não sei como aquelas pessoas conseguem sobreviver, tem que ter uma ajuda metafísica. Deus!

As reportagens abordam as mesmas coisas; uma casa que desabou e foi engolida pela encosta; um rio que transbordou e levou tudo o que as pessoas tinham; um festival de ataques de mosquitos que transmitem dengue, zica e chikungunya; vários desempregados sem qualificação; inúmeras pessoas que não tem o que comer; extermínio da população negra, e rios de lágrimas. Sou tão pequena! Mas tenho voz e uma força de vontade incrível.

Jaciara Dias
Enviado por Jaciara Dias em 11/06/2020
Reeditado em 11/06/2020
Código do texto: T6974355
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