DOÇURA

Uma calda de chocolate desce sorrateira por uma fonte instalada na vitrine. Aquele caudaloso cacau, morninho em sua queda, é realmente tentador aos olhos esbugalhados dos chocólatras de plantão que paralisados estão ao outro lado da vidraça. Aquele encorpado dulçor que escorrega suavemente a um movimento sincrônico, incita os desejos mais profundos, logicamente, enfeitiçando os clientes mais “vulneráveis”, que não hesitam a uma visita a loja de chocolates.

Existem também os doces da vovó descansando sobre as tábuas lisas de uma fraca mesa de madeira. Resfriados, após a fervura de uma mistura de sabores inconfundíveis, serão fatiados tradicionalmente em uma conhecida forma de losango pelas mãos hábeis da velhinha querida. Aquele cheiro realmente é provocativo e uma mão boba sempre ousa roubar um pedaço antes do momento apropriado. A molecada, muitas vezes alvoroçada pela expectativa, rói as unhas num ato ansioso do esperar a sobremesa. Talvez porque seria a melhor hora do dia.

Um chocolate quente cremoso também tem espaço nessa história. Preenchendo o conteúdo de uma modesta xícara parece um doce lago de cor morena aguçando o admirador incauto. Quando vertido à cavidade bucal, aquela fluidez suave exalando o próprio cheiro de uma mistura de cacau e ingredientes culinários responsáveis pela consistência cremosa, as sensações repassadas ao crânio são indubitavelmente únicas. Toda aquela dulcidão, ainda resiliente no céu da boca, faz o degustador tomar uma colher pela mão e raspar aquele resíduo já endurecido ao fundo. Se fosse servido em um prato, certamente a valentia lhe faria lamber até os últimos resquícios de chocolate.

Mas a doçura de hoje, não negando o fato de possuir um néctar incomum, é relativamente um primeiro beijo que ocorreu de forma inesperada. São ósculos que foram se aprimorando a cada roçar de lábios, construindo uma receita deliciosamente saborosa. Essa engenharia rigorosamente sustentada por um ato do gostar é uma obra-prima da meiguice. Os beijinhos, dados aos montes em intervalos extremamente curtos, são molhadinhos e se traduzem em um universo de sensações gostosas. Os beijos demorados a uma lentidão provocadora e sensual, espalhados com o dulçor de toda ternura, são a mostra perfeita e mais singela do amor. Cabe aqui relatar também uma certa malandragem daqueles lábios que as vezes mordem atrevidamente os meus, brincando na dulcidão inabalável da felicidade. E sobre o primeiro beijo...hummmm...fui apanhado de surpresa em um momento que eu me aproximava tímido pelas beirolas da bochecha.

Aqueles lábios de mel, fofinhos como um bolo, carregam a doçura arrebatadora que o melhor doce do mundo não pode proporcionar. Eu amo cada um dos nossos beijos.