RELATO DE VIDA!

Irene era uma menina de família pobre de uma cidade do interior do Paraná.

Filha de Francisca e Benedito.

Sua mãe era loira e o seu pai negro.

Era a caçula de seis irmãos, eles tinham puxado pela mãe; saíram com a pele clara.

Irene era a única que tinha nascido com a pele escura.

Suas irmãs a ofendiam por causa disso,

ela corria pro colo da sua mãe e chorava.

Dona Francisca abraçava a filha e dizia:

- Irene, não chore!Olho pra você e vejo uns olhos lindos esverdeados, minha filhinha caçulinha que tanto amo!Você é fruto de uma paixão sem fim. Não deixe que o preconceito faça você chorar.

Amo todos vocês da mesma forma, desde o meu ventre. Não existe, pra mim; diferença alguma.

Gosto de todos do mesmo jeito.

Irene se acalmou e soluçando adormeceu nos braços da sua mãe.

O tempo passou, um dia Irene estava brincando no fundo do quintal da sua casa quando ouviu uma voz que vinha lá de dentro da sua casa.

Gritou pelo seu nome, ela reconheceu a voz da sua querida mãezinha e saiu correndo.

Ao entrar na casa encontrou sua mãe caída, na beira da cama.

Dona Francisca olha pra ela e diz:

- Filha, vai chamar seu pai lá na roça. Preciso de ajuda, não estou me sentindo bem.

Irene olha nos olhos da mãe e percebe que estão vermelhos,

sai para buscar ajuda do Pai quando escuta novamente sua mãe a chamar:

-Filha, vem cá. Abaixe aqui bem pertinho da mãe.

A menina se abaixa do lado da cama onde sua mãe esta caída, Dona Francisca está fraca, abraça mais uma vez sua caçulinha.

As lágrimas rolam no seu rosto e ela disse bem baixinho:

- Filha, nunca se esqueça, você é a minha neguinha!

Ao beijar o rosto da sua filha, de repente a mãe se cala.

Irene, correndo apavorada, foi chamar o pai que estava trabalhando na roça.

Suas irmãs estavam na escola.

Quando seu pai chegou a casa, nada mais poderia ser feito. A mãe tinha falecido.

No dia seguinte depois do enterro, suas irmãs começavam acusá-la pela morte da mãe.

Dizendo por que ela não foi logo buscar socorro para a Dona Francisca. Várias ameaças foram feitas.

A mais velha das irmãs tinha dezesseis anos e deu uma surra em Irene com vara de marmelo. Deixou a menina de castigo.

-Nós vamos pra escola e quando chegarmos... Se a casa não estiver limpa e quintal varrido; você vai apanhar.

Mas não tinha como Irene fazer todos os afazeres da casa, ela só tinha sete anos de idade.

Arrumou a cama e varreu o quintal. Quando a sua irmã chegou, bateu na menina dizendo:

- Sua negra! Você não faz nada direito! Olha essa casa que você diz que limpou! Está um nojo!

Irene chorava e lembrava-se do que sua mãe tinha dito antes de morrer. Ela vira pra suas irmãs e diz:

- Tenho a pele escura sim! Orgulho-me disso, sabem por quê?

Sou a única neguinha da mãe, ela me disse isso antes de morrer.

A irmã fica com raiva e dá tapas no rosto de Irene.

Quando seu pai chega cansado do serviço, ela contou o que tinha ocorrido.

Ao passar dos anos, tudo continuava como era antes, brigas de irmãos e ofensas.

Até que num final de semana, seu pai levantou, se arrumou e foi tomar um café; só que tinha acabado o pó.

Ele saiu pra comprar café; isso eram sete horas da manhã.

As horas passaram, escureceu e nada. Amanheceu e nada!

Chamaram os vizinhos para ajudarem na procura do pai.

Passam semanas, meses, anos...

Seu Benedito nunca mais voltou. Nem uma noticia dele.

Agora aos nove anos de idade Irene tinha que fazer todo o serviço de casa

enquanto a sua irmã estudava.

Certo dia foi passar uma saia de uma delas e deixou queimar.

Quando a irmã viu o que ela tinha feito, arrastou Irene pelo cabelo e jogou na rua.

Dizendo:

- Sua negra imprestável! Suma das nossas vidas!

Ela ficou pelas ruas dali mesmo, ficava pra lá e pra cá.

Numa noite fria, foi em casa pedir pra que elas a deixassem voltar.

Mais uma vez apanhou e foi queimada com cigarro.

Elas olhavam e davam risadas, não tinha jeito mesmo, elas não aceitariam Irene de volta.

Passou a dormir na roça, onde seu pai tinha trabalhado antes de sumir.

Passou fome, frio e medo.

Resolveu ir pra São Paulo de carona, morou pelas ruas da cidade. Deitou na calçada e pegou no sono. Acordou com alguém a chamando.

Era uma voz doce e suave:

-Vamos, vou te levar pra casa. Lá você terá roupas limpas, banho quente e comida fresca.

Era uma moça linda e bem vestida.

Ela pediu pra menina não ter medo porque só queria ajudar. Irene agradeceu e foi com ela.

Era uma casa linda, tinha um quarto só pra ela.

Estava feliz, pensava que tinham acabado os seus sofrimentos.

Estava com dezoito anos.

Mal sabia que os seus sofrimentos estavam começando.

Aquela moça linda da voz doce e suave perguntou a ela:

-Onde você morava antes de morar na rua?

- Morava na cidade do Paraná. Estava morando na rua porque minhas irmãs não gostam de mim. Colocaram-me pra rua depois que minha mãe morreu e meu pai sumiu.

A moça arregalou os olhos e disse:

- Não acredito! Já ouvi esta historia.

Irene começou a tremer e chorar. Pensou:

“Acho que esta é a minha família”

A moça não a deixava sair de casa.

Batia nela. Quando Irene não estava arrumando a casa de uma irmã, era da outra. Elas eram bem de vida, estavam casadas com homens ricos.

Tinham lindas famílias e seus sobrinhos eram lindos.

Elas não gostavam que Irene brincasse com as crianças.

Irene sofria muito, mas como todo o sofrimento tem um fim

conseguiu fugir dali e conheceu Dona Maria que a ajudou muito.

Mais uma vez o destino colocou Irene nos caminhos das suas irmãs.

Certo dia ela estava com Dona Maria no hospital fazendo exames de rotina quando se deparou com uma moça em prantos.

Irene perguntou a ela o que tinha acontecido e a moça respondeu: Minha mãe esta muito mal na UTI, se nós não acharmos um doador do tipo sanguíneo dela, ela poderá morrer.

Irene muito curiosa, perguntou a moça qual era o tipo de sangue. A jovem respondeu,

ela deu um sorriso e disse:

- Pare de chorar. A sua mãe não vai morrer por causa de um doador.

A moça assustada, disse:

- Como não! Não achamos ainda!

Ela sorriu e respondeu:

- Meu sangue é do tipo que você está a procura, eu doarei pra sua mãe. Jesus diz para amarmos uns aos outros.

A jovem toda feliz falou:

- Venha! Vou te levar na UTI. Quero que você conheça a minha mãe.

Quando Irene olhou, quase desmaiou,era a sua irmã!

Ela não falou nada, foi para banco de sangue, doou e foi embora. Deixou o telefone e seu endereço, caso precisassem de algo mais.

Passaram seis meses.

Num domingo, quando estava voltando da igreja, viu que tinha duas pessoas no seu portão.

A jovem correu em sua direção e disse:

- Obrigada!A senhora salvou a vida da minha mãe!

Sua irmã que também estava ali começou a chorar e pedir perdão dizendo:

-A pessoa que eu mais odiei, foi a mesma que salvou a minha vida. O sangue de uma negra, minha irmã.

Sonia Maria F Ferreira

Nyahh
Enviado por Nyahh em 21/06/2020
Código do texto: T6983642
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