A viagem de cada um

Umas das coisas que eu aprendi com os meus pais, foi a de que uma pessoa tem que ter palavra. Isso é bem característico na educação de nortistas e nordestinos, no caso, minha família de Belém/PA.

É comum as pessoas darem sua "palavra de honra", para assegurarem um compromisso, a veracidade de uma história, um testemunho, etc.

E eu cresci com esse valor. Mas, a palavra a que meus pais se referiam, tem um conceito mais amplo.

É a palavra que é producente, agregadora, a palavra que traduz sentimentos, que leva conforto, alegria, firmeza, mansidão...

Minha mãe sempre disse, que o bem é o que sai da boca do homem, e que o contrário não é da boca que sai e sim do coração. Meu pai, dizia que uma palavra dói muito mais que um tapa, e que portanto deveríamos sempre expressar-nos de maneira gentil, e sobretudo Verdadeira, e que nunca falassemos com o coração cheio de raiva ou mágoa, pois quem estaria falando seriam os sentimentos ruins e eles não deveriam dominar a mente, a boca, ou pior, magoar outra pessoa.

E eu acredito piamente nisso. Embora não raro, as pessoas não estejam aptas a nos ouvir, a realmente escutar.

Hoje eu entendo com o meu coração, quando Jesus fala: Quem tem ouvidos que ouça.

A vaidade humana, sobretudo a vaidade intelectual, é capaz de deixar uma pessoa surda, surda e fechada em seu seguro mundinho pequeno burguês, na débil credulidade de seus equívocos e julgamentos insanos, no conforto de sua sala de estar, arregimentando legiões de seus iguais, ou nem tão iguais assim, mas manipulando-os.

No filme "O advogado do Diabo", mais precisamente na última cena, o diabo sorri para as camêras e diz que seu pecado favorito é a Vaidade.

A vaidade intelectual então, é MENOR e PIOR, essa sim fere, machuca e decepciona. Ela é pequena e beira ao rídiculo. A questão é, que normalmente ela só é constatada quando a pessoa se mostra, assim como um cancêr.

Fazer o que não é?

A palavra mesmo quando vinda da honestidade do coração, é pelo vaidoso, distorcida, julgada e condenada. Quando se fala em Amor então, é pior ainda!!

O vaidoso não sabe receber palavras de Amor, ele não sabe o que é isso!! O Amor que não pede e nem quer nada, o Amor incondicional, ele só O sabe em seus belos discursos, e em suas articuladas escritas, mas ele não sabe receber, a vaidade o ensurdece,

ele não tem ouvidos de ouvir, e pior ele sexualiza o que nem nunca teve a intenção, e ainda fala para todos os seus, como se fosse a vítima de uma percepção distorcida.

É ridiculo isso não?

Recentemente, passei pelo doentio julgamento de uma mulher extremamente vaidosa e infantil, a quem declarei o meu amor, e é uma pena mesmo, pois ela tem bom coração. Mas, a vaidade...

E alías o declarei publicamente, pois ali nada havia de vulgar, intencional, e muito menos sexual, só havia a beleza do amor que nada quer, ou intenciona, apenas se conecta.

É engraçado, as pessoas tem um discurso, completamente diferente da sua conduta, e não se preocupam em te machucar quando você só está sendo sincero, - e na sinceridade não cabe a dualidade.

Cada um viaja na onda que mais lhe apraz, e que é mais condizente com a pequenez de sua vaidade, ou com a liberdade e amor de seu coração sincero e reto.

Enfim, como as coisas da vida tem mais força quando são boas e simples, recentemente também, estava eu andando a caminho do meu carro quando vi no chão um caderninho. Um caderninho de capa dura azul, com um mangá (desenho japônes) na capa.

Eu entrei no carro com o caderninho na mão, e comecei a folhea-lo para ver se achava alguma identificação e nada!! Não havia identificação, ou nome de escola, ou algum número de telefone.

Fui prá casa, tempos depois peguei o caderninho e comecei a lê-lo. Tinha ali somente um nome: Isabela.

Isabela era o amor da vida do dono daquele caderninho, e confesso que quando li a primeira página fui até o fim. Ali ele descrevia seus sentimentos, suas inseguranças, o dia em que a Isabela seria o seu par na Festa Junina, Isabela!! Isabela!! Isabela!!

O último relato do garoto era que ele iria naquele dia encontrar-se com Isabela em frente ao Mac Donald's de um dos shoppins aqui da minha cidade, e ele descrevia sua felicidade e insegurança referentes a sua bermuda verde garrafa, e a camiseta de camuflagem do exército.

O garoto queria estar bonito prá encontra com seu amor ( e eu a essa altura já estava derretida de ler tanta coisa bonitinha!). O encontro era às 16h, e ele escreveu que chegaria mais cedo.

Era domingo, e quando dei por mim eram 15:30h. Me vesti, e fui voando até o local com o caderninho na mão para encontrar o garoto. Cidade de interior, domingão, é difícil achar uma vaga no estacionamento. Pulei do meu carro e corri até o Mac Donald's para encontrar o menino antes da Isabela chegar, e me dei bem. Ele estava lá, todo lindo, com a roupa planejada, gelzinho no cabelo, um sorrisinho meio nervoso de quem espera coisa boa, e eu o abordei com o velho e bom; - Oi, e aí, tudo bem? - O garoto apesar de nunca ter me visto sorriu e retribuiu ao cumprimento.

Tirei da minha bolsa o caderninho e entreguei a ele, o garoto arregalou os olhos e deu um sorrisão.

- Onde estava, onde você achou?

E eu lhe expliquei, contei inclusive que tinha lido tudo o que ele tinha escrito e antes de me desculpar ele disse: - Que bom que você leu, senão não saberia que eu estaria aqui hoje. Muito Obrigado!

Ele deveria ter uns treze anos, bonito menino, educado. Ele sorriu e me olhou profundamente nos olhos, de forma franca e aberta como é típico da juventude. Isabela chegou, e eu saí. Desejei-lhe boa sorte!

Fui embora, e claro me virei para trás para vê-los mais uma vez, e o que vi foi a doçura, e o amor de dois jovenzinhos se encontrando em uma tarde de domingo. O resto do meu domingo foi leve e abençoado como aquele testemunho de amor. E isso me alimentou a semana inteira, aliás alimenta até agora. E nada melhor que se alimentar de amor, ainda que não seja tua a história.

Muito Obrigada João e Isabela!