O preço caro da verdade

Não, não sou sincero nem me olhando no espelho.

Minto. Inventou mentiras para mim e sobre mim também.

A sinceridade é muito perigosa, engana a si e a quem diz que traz a sinceridade dentro de si.

Omitir a sinceridade é bom. Em certos casos, livra-nos de pagar o preço caríssimo da verdade.

Algumas vezes na vida eu tropecei na sinceridade, quis tê-la como bandeira de minha vida.

Todas as vezes que faltava com ela, para mim era uma tormenta: pedia perdão, punia a mim com castigos severos, pagava penitências terríveis, além de carregar um peso enorme por não ter sido sincero em certas ocasiões.

Fui exercitando a não sinceridade, distanciando-a da falta de verdade e até de precisar ser sincero para conseguir certas coisas.

Certas coisas e tantas coisas também não são sinceras. Muitos podem até ignorar ou me achar a pessoa mais suja e desonesta da face da terra, mas não é bem assim não.

Por exemplo: Precisei não ser sincero para me livrar de uma surra daquelas. Não sei como consegui, mas, qual o prazer de punir com força o fato de outras pessoas não ser ou fazer aquilo que é do nosso agrado?

Nesses momentos, a falta de sinceridade nos livra da punição, entendeu?

Há pessoas que são suas amigas até o ponto em que você omite certas coisas, não são sinceras, ou não dizem o que os outros não querem ouvir. Daí a necessidade de novamente não ser sincero, usar de outras palavras para salvar uma amizade.

Pessoas preciosas se foram para sempre da minha vida por excesso de sinceridade: adeus, não te quero mais. Quando você me beija, eu não sinto mais gosto nem prazer. É terrível.

A sinceridade quebrou o nosso viés de afeto, e veja que tínhamos um juramento de cuidar um do outro para o resto da vida.

Ai, dizer: Te amo!

O amor tem começo e tem fim. Não tem a obrigação de chegar e durar para sempre não.

Daí, alguém que disse "te amo", chega e diz que "não te amo mais".

Foi sincero, mas aquela sinceridade, para você, é mentira. Uma enxurrada de questionamento e lágrimas vão sendo descarregadas até a humilhação de se querer que o outro não seja sincero só para agradar um coração fragmentado.

Por isso afirmo que não sou sincero, a sinceridade passa longe de mim. A maturidade me ensinou a sorrir pelo canto da boca e a aceitar certas coisas por conveniência.

A vida precisa ser conveniente, ou não?

De que adianta sofrer e se isolar em nome da sinceridade se o tempo não para, você envelhece e perde tanto tempo querendo entender a razão perfeita de todas as coisas?

Não, nada disso, o bom da vida é o mergulho de olhos fechados. Depois que voltamos a si, podemos perguntar e saber o que foi sincero ou não.

A sinceridade é alheia às suas reais necessidades. Ela distancia você do êxito pessoal.

Não sou sincero, minto para mim e sobre mim até no reflexo da minha imagem. Pode não aceitar, a você eu dou o direito da dúvida porque sua sinceridade também não me interessa.

A falta de sinceridade me redime da solidão de ficar sozinho. Digo o que o outro quer ouvir e isso me poupa de constrangimento.

Imagine o poder de quem se sente um pavão ouriçado. Este necessita de elogios constantes, mesmo que nenhum seja sincero. Nesses casos, a falta de sinceridade é precisa para o dito que diz: manda quem pode, sobrevive quem omite a sinceridade.

A vida ensina, eu aprendo.

Agora vou me perfumar, preciso de passar desodorante nas axilas, estas estão pela hora da morte. Isso é uma sinceridade que ninguém suporta ouvir, assim como dizer que você tem mal hálito, bafo de gambá ou algo parecido.

Nesses casos, melhor faltar com a sinceridade a perder os dentes.

Minto, pode me apontar na rua e mudar de calçada, não ligo. Preciso passar manteiga no pão e comer com café antes que a vida esfrie.

É isso.

Marcus Vinicius