Mulheres

Toda noite era a mesma coisa. Exatamente as 20h30, as quatro se encontravam no bar do Zé Gordo. E quando, por ventura, uma delas era obrigada a faltar, as outras três davam um jeito de gravar e anotar todos os comentários que elas haviam feito sobre cada uma das cenas daquele capítulo. No dia seguinte, por email, ainda mandavam todas as anotações para a amiga ausente.

Amigas inseparáveis, daquelas amizades que vêm desde a infância, as quatro eram casadas. Médica, advogada, jornalista e empresária, todas eram bem sucedidas em suas carreiras. Duas delas tinham filhos, as outras duas ainda não. Às vezes, claro, brigavam com seus maridos, tinham problemas familiares, mas jamais comentavam outro assunto naquela mesa, que não fosse a novela. Nenhuma delas bebia. O que elas gostavam mesmo, era de assistir a novela no bar do Zé Gordo. Para elas, aquele encontro diário, sempre no mesmo horário, na mesma mesa, já tinha virado uma religião.

Aquela noite era o último capítulo da novela. Uma noite tensa. Será que o mocinho vai salvar a mocinha? Qual será o destino do vilão? Quem havia matado a mãe do bonitão? Teria sido o próprio bonitão?

Eram tantas possibilidades de final para cada personagem, que aquilo começou a causar um certo atrito entre as quatro amigas. Uma achava que o vilão deveria se dar mal. A outra, que o vilão deveria ficar com a mocinha. A terceira, tinha certeza de que o assassino daquela senhora era o próprio bonitão. A quarta, romântica, queria o mocinho junto com a mocinha. Os ânimos esquentaram. A discussão ficou mais áspera. Um copo voou. De repente, uma cadeira. A confusão estava armada.

Em segundos, a mesa estava virada, os cabelos estavam arrancados, as peles estavam arranhadas, o bar estava fechado e a amizade, acabada. Enquanto isso, no bar ao lado, os maridos, loucos, gritavam e gesticulavam, abraçados, completamente embriagados, comemornado mais uma vitória do São Paulo.