Você nas redes sociais

Ontem ouvi uma frase de uma amiga, que me intrigou. Quando conversávamos sobre o poder das redes sociais e de como a maioria das pessoas não tem ideia do mesmo, ela disse que é preciso ter cuidado com o que se “posta” na rede, pois, ao contrário do que ocorre na vida da dimensão palpável, carne e osso, na internet, você é o seu passado. Ainda bem que ela elaborou em seguida, pois eu teria que refletir um tanto até descobrir do que se tratava. No fundo, é simples. Todos temos o direito, e sempre o usamos, de mudar de opinião, voltar atrás, sobre tudo e todos. Certamente há muitos que não dão o braço a torcer, mas isso é outra história. Vamos nos reinventando com o tempo e conforme nossos estímulos e necessidades. Então, em determinado momento, somos a somatória, ou qualquer combinação, de todos nossos eus passados, e somos aquilo que se apresenta no momento. Se fomos feios, gordos, jovens, lindos, bons ou maus antes, não importa, hoje somos o que mostramos agora, e o passado não passa de lembranças a se memorar ou lamentar.

A questão colocada pela internet é bem mais interessante. Uma vez publicado, jamais será desdito. Perde-se totalmente o controle sobre o que se publica na internet. Pode-se retirar de lá, é verdade, mas não se tem o controle sobre quem o leu, sobre quem o guardou, o reproduziu, o compartilhou. E ao tentar desdizer, não se garante que o desdito atingierá o mesmo universo de leitores. O mesmo ocorre, só que em proporções bem menores, em qualquer meio de comunicação, televisão, rádio, jornais e revistas. A repercussão na rede, no entanto, é exponencialmente maior e impossível de se controlar.

E voltando à questão de quem é você, a imagem sua, para quem o vê na rede, é feita por aqueles seus eus que por acaso foram encontrados pelos mecanismos de busca ou nas redes sociais. E então aquilo que você expôs de si mesmo no passado pode ser a imagem que o internauta fará de você hoje, sem lhe dar qualquer chance de retocá-la ou trocá-la.

Assim, cuidado com o que publica na internet, a vítima pode ser você! Ou não. Quem, na verdade, se importa com a própria imagem, seja nesta dimensão ou na virtual? Aparentemente aqueles que publicam muito sobre si mesmos não estão nem aí com o que é feito de suas publicações. Estão preocupados apenas em construir um eu perfeito, feliz, lindo, moderno, descolado, culto, do bem, politizado, enfim, projetando tudo o que pode fazer com que os outros se apaixonem ou admirem ou invejem. Não se dá conta de que não são apenas seus amigos e inimigos quem terão acesso. Aliás, é capaz de que esses mesmos nem precisem disso para criar a imagem que têm de você. E quem mais pode ver? Que se danem, você não dá a mínima, certo? Ótimo para você então. Mas há um bom número de pessoas que se importariam. Formadores de opinião, jornalistas, pessoas públicas, frequentemente são vítimas da internet. Eu tenho uma certa compaixão nesses casos. Seres humanos que são, sujeitos a mudanças de opinião e comportamento, parecem não ter o direito de desdizer. Isso para não falar das publicações caluniosas e covardes que difamam e são gravadas permanentemente na memória infinita e atemporal da internet, atingindo um número incalculável de leitores.

Confesso que tenho receio sobre quem sou eu na internet, quem são os eus que podem compor uma imagem minha – se é que alguém pode se interessar por isso. Não sou uma internauta com o perfil de que trata esse texto. Faço parte de redes sociais, mais como espectadora. Isso não impede, no entanto, que outros publiquem coisas relacionadas comigo, fotos, por exemplo. Por meio dessas fotos, um leitor qualquer pode inferir quem são meus amigos, o que faço, por onde ando, minha idade, etc. Por mais que sejam fotos furtivas, desprovidas de contexto e de verdades sobre mim, essa serei eu para quem me vê ali. Essa serei eu daqui 10 anos ali. E então vale a assertiva: eu sou meu passado na internet. E não adianta combater com publicações frequentes de imagens mais fieis e atuais. Em algum momento em breve, eu serei o passado novamente. A conclusão chega a ser óbvia: publique na internet sobre você apenas aquilo de que você gostaria de ser lembrado em qualquer momento do tempo. Verá que não será fácil se decidir sobre o que publicar. E se ficou preocupado com o que já está lá, relaxe, não adianta mesmo tirar de lá.

(18 Janeiro 2015)

Anelê Volpe
Enviado por Anelê Volpe em 13/08/2020
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