UM POUQUINHO DA HISTÓRIA DOS OPALAS

Disfarçadamente a camioneta estacionava ao lado do velho opala já ferido mortalmente, era hora de trocar a carga do marca-passo, sorrateiramente fingindo uma verificação de rotina o diligente afrouxava os parafusos dos bornes e substituía a bateria já rouca e sem forças, por outra jovial e imponente, pronto o rádio estava apto a tagarelar com a central, só assim afastando o sono que se abatia no limiar da madrugada e do dia que estava chegando.

Sol, chuva, vento lá estava ele, acompanhado de pelo menos dois patrulheiros. As vezes o guincho o conduzia para uma faxina geral e de retorno ocupava um espaço mais para lá, mais para cá para que não nascesse florestas de guanxumas sob a proteção de tão laborioso veículo. Embora a marginália desconfiasse que ele fosse só casca, mesmo assim diminuíam a marcha e baixavam os olhos arriscando somente algumas espiadelas.

Um dia algum ciumento matou-o de vez e nem um pedacinho ficou para recordação.

Outro dia passei por ali e tentei enxergar um fantasma que pudesse ser o dele, nada feito só o concreto do que era para ser um imponente viaduto, se dele não havia resquícios muito menos dos espíritos que o habitaram no início dos anos setenta.

Nilo seria o mentor, o que emprestara vida ao opala, conforme comentários. Nilo já se foi, deixando não fragmentos, mas pedaços bem conservados que muitos insistem em desconhecer, dizer que estão ultrapassados.

Outro dia apanhei um táxi no ponto da Azenha com Marcílio Dias, manhã ensolarada, dei bom dia ao condutor setentão e ele respondeu-me com uma continência.

Dei-lhe o itinerário e ele puxou assunto. Logo adiante havia um PM atravessando fora da faixa de segurança e eu aproveitei para criticar e espontaneamente ele disse:

- No meu tempo dávamos exemplo! - Qual era o seu tempo?

- De Brigada Militar, onde trabalhei quase 30 anos no 11 BPM! - não esperei e fui indagando do tal opala que ficava na rótula da Protásio Alves com Carlos Gomes, nem bem contara sobre ele, completou:

- Chegamos! - ficamos ali em frente de casa no táxi estacionado e ele perguntou-me se eu sabia por que o opala ficava estacionado, mas não deixou-me responder e completou que era porque não tinha motor nem caixa de mudanças.

Convidei-lhe para entrar e tomarmos um cafezinho, ele agradeceu e disse que talvez outro dia e sumiu na ladeira, pelo canto do olho pareceu-me que logo atrás dele que partira passara um veículo (um opala), então voltei ao portão e era só impressão, mas bem que poderia ser o espírito de um deles que outrora habitaram as ruas zelando pelo sono e sossego de todos nós!

ItamarCastro
Enviado por ItamarCastro em 13/08/2020
Reeditado em 13/08/2020
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