Eu o concreto e nosso casamento!

O meu casamento com o concreto foi lindo, analisando nos dias de hoje, duro na época, mas engraçado e interessante e sempre que me lembro dou boas risadas desse tempo.

Meu relacionamento com o concreto começou quando tinha por volta de 14 anos de idade, lembro que não conseguia emprego registrado em uma empresa e tinha que ganhar o meu dinheiro para as roupas, as saídas com os amigos da época e para a cervejinha e os cigarrinhos esses não podiam faltar nos finais de semana.

Foi então que comecei a trabalhar de servente de pedreiro, conheci um pedreiro lá no bairro onde morava e fui então “contratado”.

Entrava ás 07:00 da manhã e saia ás 17:00, na hora do expediente executava todos os trabalhos que um ajudante de pedreiro faz, virava massa, puxava tijolo, carregava areia, e fazia o famoso 3 por 1 “ o concreto” assim ele é mais conhecido.

O dia mais cansativo era o dia que tínhamos de encher laje ou base, pois era o dia do concreto e para que ele ficasse bom era preciso que eu entrasse dentro da massa se misturando um no outro como se fossemos um casal em pleno ápice do amor, lembro que viramos um só naquele momento ai se dava nossa união. Com certeza essa foi minha primeira experiência de união a dois, mas o grande problema nessa união é que sempre eu saia marcado.

Quando chegava em casa para tomar banho e tirar o concreto do corpo, era no mínimo meia hora embaixo do chuveiro, e para variar o concreto teimava em não me deixar era um grude!

Lembro que minhas pernas saiam brancas e ressecadas então acabava com o óleo da minha mãe, mas ele ainda continuava entre as unhas ai passava limão, mas ele ainda assim persisti em estar comigo, também não adiantava muito, pois no dia seguinte nos uniríamos novamente.

Quando chegava na sexta me sentia mais feliz, até ficava contente na hora do concreto, pois era dia de pagamento e no sábado não trabalhava, além disso, por dois dias ficaríamos separados um do outro. No sábado com as pernas ainda um pouco branca, me preparava para sair com os amigos a noite, era o dia de arrumar uma namorada que não fosse o concreto lógico, quando chegava a noite íamos para lugares onde buscávamos a futura namorada, muitas vezes não encontrava, na realidade nunca encontrei e na segunda voltava para a minha velha união com o concreto.

O que é mais interessante foi que o nosso relacionamento durou cinco anos, e o concreto me permitiu ganhar meu dinheirinho, que comprava meus perfumes falsificados, minhas calças do Brás e aquele famoso camisão que era moda na época, o dinheiro era curto e quando consegui comprar meu lechevall branco que todo mundo tinha, minha admiração pelo concreto cresceu mais. E outra foi com esse dinheirinho que sobrevivi durante cinco anos sem precisar cometer crimes, roubos, mas acordando todos os dias ás 07:00 e parando ás 17:00 e tendo a coragem de enfrentar sol e chuva com o concreto esse foi nosso relacionamento!

Foi um período de muita luta e coragem, muitas vezes era mal visto por não ser um trabalho que não dava camisa ou futuro, mas foi com ele que sempre pude ter tudo que queria, lógico que meus perfumes eram falsificados minhas calças eram do Brás meu tênis até um pouco brega, mas era meu sonho de consumo e isso me fazia um cara realizado, nossa união acabou quando comecei a trabalhar registrado em uma empresa, e o concreto me deu camisa sim durante cinco longos anos.

Fábio Beltrame

Beltrame
Enviado por Beltrame em 22/10/2007
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