Você (Para Heloisa)

Amor tão estranho em si mesmo: sendo novo, guarda uma saudade imemorial, uma vontade até certo ponto torpe e posessiva de sempre estar junto, de não aceitar mais a separação de forma alguma, sob nenhum pretexto.

De certa forma torpe porque começa a recusar essa possessividade tão grande para construir algo diverso, forte e pretensamente eterno. Torpe por, no fundo, buscar prazeres simples e quase já esquecidos: o de dizer bom dia sentindo o calor do corpo amado na cama, sentir-se relevante, dar espaço para alguma briguinha de casal, tão necessária mas buscar sempre a paz satisfeita e real, silenciosa mas jamais silenciada.

Talvez eu nunca tenha procurado paz, aceitava a contenda de bom grado, uma acréscimo relativo a condição de escorpiano guerreiro, gládio sempre desembainhado. Você me pegou em um momento que não quero mais lutar, por absolutamente nada. Ir e vir, ter e perder, falar e calar, tudo é bem aceito mesmo que não caia bem.

Você me traz o silêncio das liberdades, uma cena atávica, um futuro construindo uma história. Livros abertos, idéias voando, controvérsia, construção íntima que transborda para o mundo sem jamais almejar nada senão um cair de noite na varanda daquela que será nossa casa.

Sentir o silêncio daquele lugar, transbordando e invadindo a intimidade nossa, minha alma, sua alma, o silêncio e os sons da mata que fica no fundo da habitação. Viver em paz! Quem sabe algum dia , se possível for, um choro infantil componha a multitude dos sons da natureza, da nossa natureza. Nada obrigatório, tudo por acontecer (ou não).

Talvez seja tolo ficar tratando de alegorias infantis e de alegações que o mundo não nos dá o direito de ter. Quer saber? Talvez hoje pouco importe.

No meu mundo, tão frágil como um castelo que tenha desabado e está sendo reconstruído, escolho as pedras que o compõe. No entanto há aquela, a fundamental, a amarração de toda a construção, voluntariamente eregida, diariamente consolidada para resistir ao fustigar das tempestades.

Intenção, realidade, planos , sonhos: talvez essa seja a justificativa de tanta saudade, uma certa dor mas a promessa de uma proximidade breve. Tudo isso faz com que o verbo amar seja insuficiente e que a emoção transborde pelos vãos das palavras e das linhas.

Quando isso acontece, impõe-se um farto silêncio, sempre em busca de mais emoções que justifiquem quebrá-lo. Um amor sempre impõe uma grande tempestade e uma maravilhosa calmaria.

André Vieira
Enviado por André Vieira em 22/10/2007
Código do texto: T704663