UM MOMENTO A DOIS

Dentre as muitas reminiscências que me advêm, uma prendeu-me a atenção. Foi nada mais do que um fragmento do passado tentando agarrar-se ao presente, procurando sobreviver por mais alguns segundos entre as milhares de lembranças que se perdem a todo instante. Havia tempo que eu não trazia à tona esse pequeno momento que me assomou; refletindo sobre ele, vejo agora o quanto foi uma recordação profunda e que de uma maneira ou outra, acabou marcando minha infância.

Era uma noite dessas qualquer, em que a vida corre normalmente. Eu havia me levantado da cama, não sabia ao certo que horas eram; ouvi zoadas de risadas vindas da calçada, pois o muro ficava quase encostado à porta da frente e ficava fácil de escutar qualquer coisa. Olhei no quarto adjacente, que era o dos meus pais, e notando que eles não estavam lá, deduzi que o barulho que vinha de fora era produzido por eles. Fui até lá.

— O que faz aqui fora a essa hora? — Perguntou-me meu pai.

— Ouvi um barulho e vim aqui ver. — Respondi ainda meio sonolento.

Minha mãe apenas me observou com seu olhar protetor e carinhoso.

O céu estava bonito e estrelado, a calma da noite era de uma tranquilidade bem-vinda.

— Vamos entrar, já está tarde! — Exclamou meu pai, eu obedeci.

Naquele momento, que pertencia ao meu pai e minha mãe, foi um evento comum para mim. Entretanto, quando parei para refletir sobre essa casualidade, percebi o quanto aqueles poucos minutos foram extremamente importantes, porque foram os últimos em que vi meus pais juntos, os últimos em que ouvi as risadas deles se entrelaçando.

Alguns meses depois, meus pais separaram-se; infelizmente, esse momento se perdeu em alguma gaveta empoeirada na mente deles.

Felipe Pereira dos Santos
Enviado por Felipe Pereira dos Santos em 13/10/2020
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