UM DETALHE DE NOSSA HISTÓRIA

Parabéns, meu amigo, Doutor Rogério Piccino Braga, pelo excelente artigo do último dia 23 de setembro, brilhantemente intitulado “A cana, seu bagaço e seu pulmão”. No dia em que se comemorava a chegada da primavera, antigamente celebrada de forma festiva, você abordou um assunto bastante controvertido. E, podem crer, não pretendo aumentar as discussões a respeito. Aliás, até acredito que boa parte dos meus leitores habituais, considerará este meu enfoque um tanto chato. Pensei muito antes de elaborá-lo e alterei vários rascunhos para não ferir o ponto de vista de ninguém, muito menos de todos aqueles diretamente envolvidos no problema.

Contudo, o que me levou a redigi-lo foi o trabalhador rural, justamente aquele que tem o primeiro contato com o famoso carvãozinho. Ele, as posturas e todos os riscos existentes na atividade, proporcionam o surgimento de graves acidentes e doenças ocupacionais. Se esses detalhes já são difíceis, cortar a cana na palha, isto é, sem a queima, também proporciona situações de graves riscos. Quem foi inúmeras vezes lá nas frentes de trabalho, do final dos anos setenta até meados da década de noventa, sabe muito bem o que é aquilo e a que condições o rurícola exerce a sua função, buscando o suado pão nosso de cada dia.

Quem nunca viu de perto, não tem idéia de como é nem de que forma trabalham! E olha meu amigo, que essas condições melhoraram muito nos últimos anos. Tudo pode ser creditado às normas que introduziram os princípios de proteção à saúde e segurança no trabalho, em 1977, além do desenvolvimento de intensas fiscalizações visando a sua efetiva aplicação no cotidiano dos homens do campo.

Mas, Doutor Rogério, talvez não se lembre ou não saiba da grande greve dos rurais, aqui na região, em maio de 1984. Ela chegou assim, de repente, como uma espécie de grito de alerta daqueles que, até então, só sabiam trabalhar muito, transportados de qualquer maneira e contratados por intermediários que, em nome da amizade, subtraíam boa parte dos seus direitos. A situação ficou muito tensa, embora os homens rudes só mirassem o seu futuro.

Foram vários dias de intensas negociações, procurando-se evitar, acima de tudo, que o movimento acabasse fora de controle. Mas, finalmente, o bom senso imperou e a paz retornou ao campo. Hoje, vinte e quatro anos depois, poucos relembram o episódio, a não ser os que dele participaram diretamente, como Hermínio Stefanin, do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Jaú e o Doutor Antonio Augusto Beluca, dois dos grandes articuladores dos acordos que encerraram o movimento, além da mediação dos Auditores do Ministério do Trabalho Wilson Antonio Bernardi e Rosaria Conceição Mene que conduziram as negociações. A este humilde escriba coube a tarefa de redigir as inúmeras atas de mesas-redondas numa velha máquina de escrever.

Alguns poderão perguntar a razão desse enfoque. Simplesmente porque, por mais que o tempo passe e tudo se modifique, ele jamais deixará de ser “um detalhe de nossa história...”

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P. Preto é jornalista.