ESCREVO PARA NADA E PARA NINGUÉM.

“Eu escrevo para nada e para ninguém. Se alguém me ler será por conta

própria e auto-risco. Eu não faço literatura: eu apenas vivo ao correr do tempo. O resultado fatal de eu viver é o ato de escrever. Há tantos anos

me perdi de vista que hesito em procurar me encontrar. Estou com medo de começar. Existir me dá às vezes tal taquicardia. Eu tenho tanto medo de ser eu. Sou tão perigoso. Me deram um nome e me alienaram de mim". Clarice Lispector

Recebi em comentário esse texto de Cerson Machado, um amigo recantista. Faz tempo.

Me disse uma amiga ainda agora, Maria Alice, colega dos bancos de faculdade, que me impulsionou a essa construção.

Ela, Clarice, era a personagem de seus textos, o que é integral verdade. Intimista, projetando seu ser e existir com força em sua obra. O texto encimado demonstra essa introspecção como regra padrão.

Diríamos, mas todos fazem isso, os que escrevem. Sim, respondemos, mas existe um entorno em algo, alguém ou entorno social e problemática plural do que vivemos, em motivação do que se externa. Admiro demais sua liberdade em divagar e ornar essa liberdade, essa mais que licença poética para vagar. É mulher..

Muitos escrevem por ofício, diletantismo, terapia ou utilidade, como faço, profissão, utilidade e necessidade. Todos têm sua razão.

Parece que com ela o núcleo era sempre ela, mas de forma etérea, solta, diversa do comum, entregue ao sonho, à realidade da vontade sem freios, dando asas aos seus voos.

Clarice Lispector, encantadora em sua privacidade, textos intimistas e insondáveis à inteligência que nada na superfície. Mergulhos profundos em seu rosto de mulheres como em Modigliani, trazem sedução e encantamento. Amedeo Modigliani, pintor e escultor italiano, conhecido como o “Príncipe de Montparnasse”, Paris, famoso por seus retratos com rostos alongados e nus eróticos.

Clarice enlaça esses píncaros de um mundo diferente. Liga a fatalidade a escrever. Tem medo de ser ela mesma, e não quer seu encontro com a realidade, por isso nos enriquece quando flana por lugares a nós desconhecidos, mas que encantam, seduzem, e alongamos os braços e a íris para se tornar possível voar e flanar em seus voos. Mas ela vive apenas ao correr do tempo, os outros correm atrás do tempo enquanto ele passa.

O tempo é doce e implacável, deixá-lo correr sem tentar alcançá-lo é tanto real como de fina e rara inteligência. A inteligência que nela sobrava.

Celso Panza
Enviado por Celso Panza em 05/11/2020
Reeditado em 05/11/2020
Código do texto: T7104852
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