A praça de Rubens

Agora que o tempo não exerce tanta tirania sobre mim, permito-me assistir a inúmeros filmes “das antigas”. Além de cotejá-los com as lições de linguagem do cinema aprendidas do professor Renato Felix, aproveito também para observar as mudanças de costumes acontecidas ao longo do tempo. O hábito de fumar, por exemplo, antes tão comum, quase que ficou para trás. E o destino das “piolas”? Revendo Bonequinha de Luxo, chama atenção as incontáveis vezes que os protagonistas, ao acabarem de fumar, atiram as bagas em qualquer canto. Há até uma cena hilária em que o “mocinho” esgueirando-se pelo chão em uma festa, aproveita o momento em que um convidado levanta o pé e coloca o cigarro para ser esmagado “na descida”. Vê-se que nesse aspecto higiênico a sociedade mudou para melhor. Ou SQN (só que não)?

Corte - para permanecer na linguagem cinematográfica - e falar de hábitos no século XXI. Quantos ainda temos que mudar... Um deles: passear com o cachorro pela rua, ver que ele está depositando os seus excrementos por onde passa e não ter a iniciativa de efetuar a limpeza.

Tinha um amigo de longas datas, Rubens, que era privilegiado com uma praça em frente a sua casa. Ele zelava daquele espaço público como se fosse uma extensão da sua residência. Ali ele plantava cajueiros, siriguelas, mangueiras e outras espécies, na tentativa de aformosear a praça. Certa vez por lá passando, num mês de novembro, vi o cajueiro imenso, cuidado com esmero, cheio de frutos. A cena que presenciei diz tudo. Dois senhores pararam, viram um caju que nem pronto para consumo estava, e começaram a atirar pedras para derrubá-lo. Só que com esse gesto iam atingindo não apenas o alvo, mas tudo o que estava ao redor. E Rubens, lá da sua casa, viu aquela cena, e como bom cuidador da planta pediu que eles parassem de atirar pedras. E com toda a atenção entregou-lhes uma vara com uma garrafa pet na ponta, para facilitar a retirada do fruto, sem derrubar os outros ainda em formação. Pelo visto ele não se zangava com isso. Talvez ele pensasse no prazer daquela pessoa colhendo o caju do pé, rememorando alguma agradável situação da infância, tornando-se um pouco mais feliz.

Agora, se tinha uma coisa que deixava o meu amigo injuriado era encontrar cocô de cachorro na calçada. Ele até iniciou a sua cruzada e em cada árvore da praça colou um cartaz alertando os racionais, donos dos animais irracionais, para darem um destino mais adequado àqueles dejetos.

Cuidar de animais, qualquer que seja ele, é sempre saudável, faz bem ao espírito. Zelar pelo bem comum, também. Pelo que tenho observado tem aumentado o número de pessoas que cuidam de cães, é só observar ao redor. E com eles passeiam pelas praças em que os seus animais vão deixar as suas fezes. Muitos levam um saquinho plástico para recolher os excrementos e colocá-los na lixeira mais próxima. Infelizmente na pracinha que meu amigo Rubens cuidava com tanto zelo, nem todos os moradores daquelas imediações tinham esse cuidado. Um dia, tenho a esperança, essas cenas serão lembradas como aquelas dos filmes antigos, e que moram lá no passado. Saudades do meu amigo...

Fleal
Enviado por Fleal em 17/11/2020
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