Apenas lembranças

E quanto tempo, meu Deus!

Eu deveria ter quase 10 anos, ou talvez um pouco pra mais ou um pouco pra menos, vai se saber a data exata, naqueles longínquos tempos não tinha o tal do celular, o pequeno computador errante, companheiro nosso a todo instante, então tem de ser na memória mesmo!

Dona Maria Vitória, ah! A minha falecida mãe, que nessa época estava novinha, já era uma conhecida catequista, mas tinha outros afazeres, mesmo mãe de 16 filhos incluindo eu, é lógico! Cuidava de imensidões de crianças orientando nos caminhos do Senhor, as amigas dela aquelas mais íntimas diziam para ela:

--- nossa! Dona Maria Vitória, tantos filhos e ainda cuidar dos filhos dos outros? Ela respondia na bucha: (ela sempre respondia o que pensava, e era na hora) ---esses meus filhos do catecismo são aqueles que o meu mestre Jesus me encarregou também de cuidá-los.

Voltando a falar da personagem principal desta história, um dia eu estava assistindo uma de suas aulas de catecismo e um menino daqueles meio dose pra leão mesmo, me pergunta:

--- é sua mãe não é?

Eu respondo, sim ela é!

--- mas ela é branca e você é negro.

Fiquei calado mas no meu pensamento eu respondia:

--- lógico seu jumento, pois o meu pai também é negro, eu e alguns dos meus irmãos puxamos pela sua linda cor!...

Outra ocasião minha mãe estava ensaiando um teatro com seus alunos, (eu falei que ela tinha outros afazeres) ela era tudo, diretora, ensaísta, ensinava nos efeitos especiais, e nos ensaios era de uma exigência rígida. Eu estava entre alguns atores, (imagina eu ator!) numa das vezes que deveria declamar, errei feio e ela mais do que depressa me diz:

--- sai fora, Lourenço, você não tem dom de interpretar, vou substituir você!...

Saí correndo não queria ser artista mesmo, rsss...rss...

E depois de tudo pronto, quando o público assistiu o teatro na presença de grande prateia, foi um verdadeiro espetáculo, tanta emoção, que no final muita gente saiam chorando.

Eu sempre dizia para minha mãe:

--- mãe, se a senhora conseguisse estudar mais um pouco, poderia ser muita coisa, por exemplo, vereadora, prefeita, deputada, muita coisa mais...(ela não chegou a estudar nem dois anos na escola, seu pai disse à ela que mulher não precisava estudar, eu já falei em um de meus textos...) mais uma vez ela respondeu com toda sua convicção:

--- eu não almejo sucesso a minha felicidade é cuidar bem da minha família e fazer a coisa que também mais gosto participar da catequese.

O tempo passou, minha mãe já estava bem idosa, até para ler já não conseguia, teve um dia que ela me disse:

--- ah! Meu filho, já não tenho mais nada para fazer aqui, queria que Deus me levasse! Eu lembrei ela e disse:

--- mãe, mas foi a senhora mesmo que disse, quando na sua infância no momento de sua Primeira Comunhão, fez um juramento a Jesus, que queria viver muitos anos amar sempre a Deus sobre todas as coisas e a todas as pessoas também?

Ela emocionada até sorria.

E foi em 2010 que ela parte para a Pátria Celeste aos quase 100 anos de idade.

E eu teimosamente insistindo a Deus:

--- Senhor, ela tem que estar no Paraíso, nos seus Céus onde não existe tristezas, nem tempo e espaço, porque na Terra ela lutou, sofreu principalmente nos últimos de seus dias.

EU SEI QUE PARA MUITOS ATÉ SE TORNA EXAUSTIVAS AS HISTÓRIAS QUE CONTO DE MINHA MÃE, MAS PARA MIM TORNA-SE UM LENITIVO, UMA LEMBRANÇA QUE FIQUE PERMANENTE.