Indefinida...



Sentia um aperto no peito e, talvez por isso, se sentisse tão pequena e, talvez por se sentir pequena, seu olhar se alongava comprido e fino como um córrego rio. Possuía rios no olhar e com os olhos sorria sempre que não conseguia definir sua aflição.
Era aflita e leve e respirava nuvens, fragrâncias de frascos vazios, respirava a essência dos seus dias e se sentia suspensa. Ela estava apaixonada pela vida que avistava ao longe presa pelo fio do olhar que se alongava, ela se prolongava com os olhos pousados na fuga do horizonte. Às vezes ouvia risos e vozes que pareciam vir de muito longe, e uma mão a tocava e no movimento lento de uns lábios ela lia a pergunta: “...em que mundo você está?...”.
E todos tão certos e definidos, todos felizes desempenhando, todos corriam tão bem em volta do fogo, as fogueiras que eles pulavam, as ondas que eles furavam, todos mergulhavam tão bem de olhos abertos, todos se destacavam em cores volumosas à sombra de luzes que vinham do céu enquanto ela esmaecia num olhar de aquarela.
Nunca estava a postos, mas sempre prestes a tropeçar numa pedrinha, a se queimar com uma faísca, a se afogar numa gota. Ela se distraía com o que via ao longe, pelo que viria sem saber por onde, e se esquecia pequena e aflita parada de olhos parados, sustada, possuída por uma vida possível. O rosto contraído de pensamentos distantes que contornavam seu corpo e a levavam leve e aflita a pular fogueiras, a furar ondas, os olhos abertos ardendo... ardia o peito apertado de sentimentos e uma alegria surgia banhada em tristeza temperando a saliva. Ela sorria sentindo o gosto da lágrima na ponta da língua sentindo o mar encrespando na boca e mergulhava numa nostalgia que a destacava pálida na sombra das asas na iminente fuga.
Ela fugia do mundo sempre que se buscava e retornava cada vez mais apaixonada, pequena e aflita respirando nuvens, a sua essência leve nos frascos vazios, seus olhos se prolongando nos rios, ela sorrindo se alongando suspensa e tudo começava de novo...