Qual foi a última vez que você sonhou?

Minha irmã sempre compartilha seus sonhos comigo, suas expectativas e eu quase nunca tenho muita coisa pra oferecer em troca. O que ganho com essas conversas são uma dose de introspecção e angústia:

Quando a existência parou de ser um mistério? Parou de ser algo pela qual almejo e idealizo? Sinto falta de idealizar, de sonhar e imaginar.. caramba, como sinto falta de imaginar! Mas, logo que começo alçar os primeiros voos nesse mundo paralelo, tropeço em muitas pedras e parece que estou sempre muito pesada pra decolar . As nuvens ficam distantes e sempre quando tento alcança-las cordas se enrolam em meus braços e pernas e a luta é infinita: um pé no ar, o outro no chão, as vezes os dois no ar ( quando sou forte), e logo depois os dois no chão novamente. A vida daqui de baixo parece ser tão enfadonha e cinza. Nas nuvens, há uma dança de cores, há brisa, cheiros e texturas, há enigmas, há uma beleza indecifrável. Tudo o que eu queria era voltar a habitar esse lugar que já fora muito visitado por mim na idade de ouro, a curta infância que tanto pedi que acabasse. Quão tola fui ao querer conhecer as pedras e o chão... tão sem graças, brutos, secos e inundados de uma monotonia repleta de fulminação.

Meu pai me disse uma vez: toda fase da vida tem a sua beleza. Sigo procurando-a em meio a esse espaço-tempo no qual me encontro, que mais se parece com o planeta vizinho: rochoso, vasto, solitário, árido e monocromático. Estaria a beleza na estática da pedra? Na dança dos ventos? Não sei dizer.

Queria me desfazer das amarras que me prendem ao chão, queria chutar as pedras sem machucar meus pés, queria que pensamentos felizes fossem o suficiente para me fazer voar. No entanto, as minhas coordenadas galácticas ainda não correspondem às da Terra do Nunca. Quem sabe eu ache o mapa pra lá e quem sabe... eu volte a sonhar.

Mari Verona
Enviado por Mari Verona em 25/03/2021
Reeditado em 25/03/2021
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