MARTINI COM CEREJA

Este texto - espetacular, muito realista e que nos projeta para dentro de sua história. Quem não se apaixonou pela professorinha (ataulfo alves). "EU era feliz e não sabia",mas só sei que apaixonei pela bela "fessorinha". Parabéns ao autor que soube nos levar a um passeio que estava perdido no tempo"

Leiam com a alma.

MARTINI COM CEREJA

Os finais de semana, os feriados, as férias eram um martírio para o adolescente. Ele adorava a escola. Ou melhor, adorava as aulas de Biologia. Pena que eram apenas 3 aulas na semana. O menino buscava sempre a melhor posição na fileira da sala de modo que pudesse acompanhar todas as explicações e principalmente apreciar a beleza da professorinha recém-formada.

Ela, muito jovem ainda, usava calça jeans desbotada e tênis. Sempre muito alegre, comunicativa. Dizia que adorava a profissão de professora. Sala lotada, alguns totalmente alienados, fuçando no celular, outros cochilando, porém havia aqueles que estavam realmente preocupados em aprender. Entre eles estava o André. Adolescente, com os hormônios à flor da pele, não tirava os olhos da professora. Não era um aluno excelente em notas, mas em bons modos era nota 10. Sempre chamava a professora em sua carteira para tirar alguma dúvida. Dúvida? Era na verdade o prazer de estar bem pertinho de sua amada. Houve um dia em que a professora não estava trajando calça jeans, mas sim uma saia razoavelmente curta, com as lindas pernas bem à mostra. O aluno, neste dia, mal pode escutar o que a professora dizia. No final da aula, muito excitado, logo foi ao banheiro. Era paixão misturada com uma grande atração física. Afinal nem ele saberia explicar. Freud, talvez.

Aos 12 anos matriculara neste colégio e já contava com 16. Esta professora sempre deu aulas para ele. Tivera sorte? Os anos iam passando, mas aquela atração física, amor talvez, não mudava. Pelo contrário, a cada ano, a professorinha lhe parecia mais linda, delicada e inteligente. Na tenra idade, deixava na prova uns corações e beijos, ao que ela retribuía. Na adolescência, os elogios eram diferentes: “Gatinha”, “Lindona”... Um dia, deixou na prova o pedido do número do whatsapp da professora. Ela, muito gentil, passou. Era tudo o que ele queria naquele momento.

As conversas foram amiudando. Ele já não era mais aquele menino franzino. Estava forte, corpulento, frequentador assíduo das academias. A professora começou notar sua presença. De manhã, a primeira coisa que fazia ao acordar, era olhar se havia alguma mensagem do aluno no celular. Mas ele o fazia rotineiramente.

André já estava no último ano do ensino médio. Vestibulares, Enem e outras provas deixavam o menino preocupado, mas nada disso contribuía para um distanciamento entre eles. Um dia, depois do recesso de julho, perguntou a ela como havia sido suas férias. Ao que prontamente respondeu: “Foram boas, apesar de sua ausência física”. O menino sentiu um calafrio na barriga. Seria verdade, ou apenas uma gentileza? Mais tarde, quando recolheu no seu quarto, antes de dormir, escreveu-lhe uma mensagem: “boa noite, minha linda, aquela resposta sua me deixou pensativo. Você está sendo sincera? ”. Ela apenas mandou uma figura de um coração vermelho. Aquela noite fora longa para o garoto. Acordava de madrugada e ligava o celular só para visualizar aquele coração. Estaria sonhando?

Sempre ficava sentado no mesmo lugar durante o recreio, pois sabia que ela passaria por ali e ele poderia apreciar sua beleza de perto. Ninguém desconfiava de nada. Ele era sempre muito discreto. Talvez seja isso que despertou a atenção da professora.

Era o último ano da turma. Que triste! Logo não poderei mais ver minha professorinha querida. Os meses voaram. Dezembro chegou. Festas natalinas...

No dia da colação de grau, o menino estava de terno e gravata. Sempre com um olhar sorrateiro à procura da professora de biologia. Logo ela aparece. Muito bem produzida, de vestido longo, muito elegante. O garoto estava completamente apaixonado. Ela já havia percebido, mas fingia que não notava a presença dele.

No baile, o garoto aproximou-se dela e chamou-a para dançar. Ela aceitou. As amigas, colegas de profissão, acharam meio estranho o comportamento dela. Inveja? Sei lá. O menino estava assanhado, talvez as doses de whisky às escondidas, deixaram-no mais atrevido.

Logo ela voltou à mesa e sentou com as colegas novamente. Nossa! Está poderosa, heim colega? Uma delas quis insinuar algo, mas ela sorriu disfarçadamente. Nada, este menino é muito educado e gentil.

André continuou se divertindo com os amigos. Mas ela não o perdera de vista. Já era madrugada, o som muito alto, a garotada frenética, com as luzes coloridas rodopiando, pulava de alegria. As horas já se avançavam, quando do nada André aparece e senta à mesa bem ao lado dela. O coração disparado. As colegas, percebendo o lance, logo levantaram na intenção de deixá-los a sós.

Mal podiam conversar, o som estava muito alto. Mas os olhares se cruzavam com uma certa cumplicidade. Ele deslizava os dedos nas suas mãos. Ela, aparentemente nervosa, segurava a aste da cereja e mergulhava-a na taça de Martini constantemente.

Feche os olhos e abra a boca – ela sussurrou no ouvido dele. De súbito, ela pega a cereja e coloca na sua boca. O beijo fora inevitável. Quisera ele que fosse interminável o sabor daquela cereja tão vermelha, tão doce e cheirando a álcool...

André passou no vestibular de medicina e foi embora para a cidade grande.

No ano seguinte a professora volta às aulas. Meio cabisbaixa, sem aquele entusiasmo em se vestir. Chega na sala e olha para as carteiras. Tantos alunos, alguns novatos. Mas, parece que falta alguém muito especial.

Onde estaria André naquele momento?

Ele, quando cansado das tarefas diárias, deita numa rede, pega uma cereja, mergulha numa taça de Martini e divaga em pensamentos, ouvindo Almir Sater:

“Os caminhos mudam com o tempo, só o tempo muda um coração” ...

Profº Inácio Franco – 08/05/2020

inácio
Enviado por Milton Furquim em 19/05/2021
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