O próximo ato

- Por muito tempo eu me senti meio idiota por esperar que alguém fosse capaz de sentir algo por mim nessa intensidade... Hoje eu tenho certeza que nunca vai acontecer – Taianah me disse, depois de ler um texto que eu tinha acabado de lhe mostrar.

- Como você pode ter essa certeza? – Perguntei.

- Só é algo que eu sinto nas pessoas. A intensidade nelas só existe quando é conveniente. Hoje em dia nada é feito pra durar. Os sentimentos... e até as coisas que compramos. Tudo é provisório, efêmero, líquido. Tudo está fadado à um tipo de obsolescência programada. Amores já nascem com prazo de validade, pra poderem ser substituídos por algo novo. O prazer parece estar na novidade das coisas. E eu já estou me sentindo velha... velha demais pra esse circo.

Passei um tempo processando as palavras dela. Todo aquele sentimento... toda aquela dor represada. Tudo me soava familiar. Minhas dúvidas, minhas próprias dores... eu queria lhe dizer que ela não estava sozinha, mas as palavras morreram na minha boca.

- Não acho que seja idiotice esperar intensidade dos outros. Talvez não seja muito saudável... mas não é idiotice – Foi tudo o que consegui dizer ao fim de alguns segundos de silêncio.

Taianah sorriu e me devolveu o papel com os meus versos.

- Gosto de ler o que você escreve porque de alguma forma tuas palavras me lembram que o amor não está morto.

- O amor não está morto, mas ele vive tentando me matar. – Respondi, depois de tomar um gole de cerveja.

Taianah sorriu. Mas o seu sorriso só me fez ver o quão triste ela estava. Era um contraste estranho... como se fosse dia e noite dentro dela ao mesmo tempo, e de alguma forma a noite parecia estar vencendo. O mais estranho de tudo isso, era que essa sensação era a mesma que eu tinha quando me olhava no espelho.

Talvez eu tenha ficado perdido nesse pensamento por muito tempo, porque o sorriso dela se desfez e ela perguntou com uma voz um tanto constrangida.

- O que foi?

- Tive um dèja vu. - Falei quase que automaticamente.

- Odeio quando isso acontece comigo. – Ela falou.

- Por que?

- Não gosto da sensação de já ter vivido algo. Me dá a sensação de que a vida não passa de uma peça de teatro em que se entra no palco já sabendo o roteiro.

- Se for assim, o roteirista da minha vida deve ser um bêbado pior que eu mesmo.

Taianah sorriu novamente, me deu um beijo nos lábios e ficou ofegante, parada com o rosto junto do meu.

- O que foi? – Perguntei surpreso.

- Nada... só tive vontade de rasgar o roteiro - ela respondeu.

Sorrimos os dois dessa vez...

Ansiosos talvez... Esperando o começo do próximo ato.

Rômulo Maciel de Moraes Filho
Enviado por Rômulo Maciel de Moraes Filho em 20/07/2021
Reeditado em 20/07/2021
Código do texto: T7303238
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