Por que eu não me basto: Ela se perguntava sempre, sempre e sempre.

Por que eu não me basto?

Ela se perguntava sempre, sempre e sempre.

Quais os motivos da minha ânsia nos fins de semana, durante os anos, durante as noites ou durante toda a minha vida? Nasci assim com sistema de completude incompleto? Será que deveria ter ficado mais no útero da minha mãe ou não tive essa mãe que colhe durante a infância, só tive uma meninice de solidão. Olho para trás e penso que sempre vivi assim nessa busca insana de preencher essa cratera. Sou uma de pessoa de faltas, nada me basta, tudo me falta, nada me completa. Quando estava contigo, não era feliz, buscava alguma coisa que nunca encontrei em ti, nem em ninguém. Mas quando tu habitavas a minha vida, sempre tinha para onde regressar, mesmo que fosse uma relação abandonada de afetos. Os finais de tarde de sábados e domingos não eram tão despovoados, eu podia voltar correndo para a ausência que tu me davas, tínhamos uma lacuna acompanhada de longos silêncios. O pior de tudo é que eu quero tudo isso de volta de uma doentia forma. Essa solidão, esse não ter o que fazer aos fins de semana acabam comigo. Se ao menos tu mostrasses algum arrependimento, alguma chance de ter uma manhã entre nós, mas não, somente eu errei para ti. Sei que sou um ser de falhas continuas, mas te amei ao ponto de me desconfigurar por ti. Tu retiraste milhares de lasquinhas de mim nesses cinco anos, elas eram invisíveis ao olho nu, porém existiam e aos poucos fui ficando lasqueada, quebrada como uma boneca que o tempo estragou, ainda assim, sinto a tua ausência de uma forma descomunal. Tu me viste ir saindo da tua vida e nada fez, deixou-me ir para não mais voltar. Sei que sou ser de falhas, um ser imperfeito mirando um precipício prestes a cair cambaleando entre o álcool e as drogas autorizadas. Sou uma cratera sem fim dividida entre a insanidade e a lucidez, sei que jamais sou feliz ou completa em momento nenhum. Eu te amava e habitava a vida somente para ti, já tu existias para o mundo, para qualquer coisa, nunca se preocupou em se modificar para continuarmos juntos. Eu só retorno para mim: a única coisa que te dou hoje é o meu silêncio para que entendas que não adianta mais. Não existe uma amanhã para nós nem hoje, nem depois, dói imensamente, mas tudo se findou mesmo, pois vives numa superfície rasa já eu sou um longo lago profundo e autodestrutivo que jamais tu vais alcançar.

Maio de 2021

Marisa Piedras
Enviado por Marisa Piedras em 18/08/2021
Reeditado em 16/02/2022
Código do texto: T7323314
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