CLICHÊS

Não me envergonho de dizer que a minha cultura deixa muito a desejar. Das coisas que sei, aprendi com a vida e com as surpresas que ela nos oferece.

Gostaria, mas não sou um grande leitor, no entanto, li coisas maravilhosas das quais não ouso fazer citações, pois não sou tão zeloso na fixação de momentos especiais.

Certa vez fiquei maravilhado com a descrição do voo do condor, feita pelo Machado de Assis, no romance Helena, se não me engano. Quis voltar lá e reler aquele pedaço, mas não achei. Maravilhado mesmo fiquei ao ler Os Miseráveis do Vitor Hugo, Jean Valjean é um personagem com o qual me identifiquei na personalidade, com todas as ressalvas que se possa fazer, ou que devam ser feitas. Dos Miseráveis, entre tantas passagens inesquecíveis, destaco a parte do bispo e os castiçais. Um bispo que no seu procedimento, honrou o Cristo, como ninguém.

Voltando lá pra minha pobre cultura, fiz esse rodeio para justificar, ou para desculpar a minha ignorância que naquele momento, naquele dia, naquele lugar, deixou-me em situação um pouco constrangedora, mas no fundo foi uma grande bobagem.

Esse bobo acontecimento já tem no mínimo uns trinta anos, mas toda vez que a palavrinha pinta, eu me recordo como se estivesse lá.

Estava acontecendo um concurso público na cidade de Jarinú, no estado de São Paulo e minha mulher estava naquela prova e eu do lado de fora esperando. Uma mulher bonitona se aproximou e puxou conversa comigo. Logo vi que o nível cultural dela era mais ou menos um sete a um em meu desfavor. Ela era bem esnobe também. Começou a falar de cinema, de filmes, utilizando um linguajar para mim de difícil compreensão, e nesse quase monólogo, pois eu mais ouvia, ela pronunciou a palavrinha “clichê” e repetia constantemente ao comentar os filmes, dizendo que se utilizavam muitos clichês, e eu não conseguia descobrir no meio do falatório dela, o significado da tal palavrinha. O engraçado é que percebi que era uma palavra bem comum, o que fez a minha vergonha por não saber do que tratava ficar ainda maior. Lembro dela me questionar, querendo saber se eu concordava que em tal situação tal coisa era clichê.

Consegui disfarçar a minha ignorância até o fim, até no momento que minha mulher terminou a tal prova.

De clichê em clichê, vou escrevendo os que não posso chamar de garranchos, pois o computador me quebra o galho. Fosse a mão, nem eu compreenderia.

JV do Lago
Enviado por JV do Lago em 09/09/2021
Reeditado em 09/09/2021
Código do texto: T7338830
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