Livrarias

As antigas livrarias me vieram à mente. Não as da antiguidade, como a de Alexandria, mas as contemporâneas tão ao nosso alcance. Dois fatos serviram de “gatilho”. O primeiro, uma viagem a Salvador e o outro a leitura de uma bela crônica sobre o tema, de Lucas Arroxelas (Livraria de Luiz: espaço de cultura). Da cidade de São Salvador, uma surpresa. Percorrendo um dos seus Shoppings à procura das duas livrarias em que costumava folhear livros e tomar um café, deparei-me apenas com o que restou: um pequeno quiosque. Triste, mas não apenas um fenômeno baiano, pois em todo o Brasil outras livrarias também estão em processo de extinção. Fica tudo na conta da pandemia? Claro que não. É um processo antigo, mas que se acentuou com o vírus. Sem poder sair de casa as pessoas, que antes as visitavam, passaram a fazer as suas compras pelos canais virtuais.

Estando na Bahia lembrei do tempo da Livraria Civilização Brasileira, na Avenida Sete, um dos pontos de encontro da intelectualidade baiana, que eu, de enxerido, acompanhei entre os anos 60 e início dos 70, quando ainda morava por lá. Frequentava também os sebos que se apinhavam numa rua próxima à Rua Chile e que não tenho notícias se ainda estão por lá. Era um passeio que muito me aprazia pois, da mesma forma que Borges, “sempre imaginei que o paraíso fosse uma espécie de livraria”.

Depois que ganhei o mundo, “pelas ruas que andei procurei...” e encontrei livrarias. Algumas de tirar o fôlego como a centenária El Ateneo, em Buenos Aires, considerada a mais bela da América Latina, a Bertrand do Chiado, em Lisboa, a mais antiga do mundo em funcionamento, A Más Puro Verso, em Montevideo, a Cultura e a Martins da Avenida Paulista, visitas obrigatórias quando de passagem pela Desvairada, mas vi também a Livro 7 em Recife, do livreiro Tarcísio, que completaria 51 anos agora, se aberta ainda estivesse.

Em João Pessoa as livrarias também têm história. A do Luiz, tão bem retratada por Lucas, na crônica comentada, frequento desde meados dos anos setenta, com Seu Luiz ainda vivo, num endereço anterior ao que hoje ocupa. Tinha ainda a de Bartolomeu, o livreiro meio que um personagem Drummondniano, “sério, simples e forte”, mas que ao contrário da figura do poema tinha muitos, vastos amigos “atrás dos seus óculos e do bigode”, que o seu estabelecimento frequentava. Depois veio a Livraria Legal, de Josivaldo, lá perto da Igreja das Neves, que fazia parte do périplo livresco que costumava acontecer aos sábados.

Mais recentemente uma experiência livresca tomou corpo e logo se extinguiu por aqui, no Zarinha Centro de Cultura. Costumava dizer que era o meu escritório, pois marcava presença constante por lá. Um grande amigo, Domilson, já conhecido de outras livrarias, estava na gerência. A sua característica: conhecia o leitor e à chegada deste já ia apresentando os títulos que faziam parte do universo de interesse da pessoa.

Continuo frequentando a Livraria do Luiz, não tanto como gostaria, é verdade, mas acompanho de perto os eventos culturais que sempre estão acontecendo por lá. Ricardo herdou do seu tio as boas características de um livreiro: cordialidade e atenção ao mundo cultural.

Hoje, mesmo tendo aderido à modernidade dos e-books e das compras pela internet, continuo achando as visitas às livrarias essenciais. Folhear os livros, interagir com as pessoas, conversar com o livreiro, o cafezinho enquanto se seleciona o que vai levar, tudo isso não tem preço e acontece nesse ambiente de magia que só as livrarias propiciam. No mais é torcer para não chegar o dia de dizer Livrarias “não há mais”, assim como a Minas do poeta para o seu José. E, sem as livrarias, quem sabe o “para onde?”.

Fleal
Enviado por Fleal em 16/11/2021
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