Leituras que marcaram

Ano que vai, ano que vem. A gente até torce para que tudo volte ao que era antes, mas nem o mimetismo do bichinho, nem a insensatez dos bichões, permitem. E persiste a profecia do poeta, cantada pela que se fez estrela “perdoem a falta de um abraço, perdoem a falta de um espaço, os dias eram assim”. Até quando?...

E assim passa mais um Natal com memórias afetivas que alegram, e também entristecem, como numa releitura dos versos de Cecília: “não sou alegre nem sou triste, sou Natal”. Amigos que se foram, parentes queridos que nos deixaram beirando a orfandade, renascem na trilha sonora do Natal de muitos anos, com o rei pinicando na alma dizendo que “as lembranças me chegam sempre em noites tão vazias e mexem tanto com minha cabeça, que quando o sono vem, o dia já nasceu”. Bem assim...

Mas foi também um ano de muitas leituras, ajudando a afastar o marasmo da falta de viagens, a partir dos voos que a literatura permite. Participar de um clube do livro, muito ajudou, as pesquisas atestaram isso.

Como participante de dois deles, foram várias as obras que li. Algumas delas, claro, me encantaram mais que outras, merecendo comentários. Um adendo: o que mais me atrai num livro (e em filme também) é a boa história. Pode até ser banal com um tema já repisado, para mim o que importa é a forma como a trama é desenvolvida. Já vai longe o tempo em que tinha a “obrigação” de ver, por exemplo, um filme hermético que não ligava as pontas e ter que sair da sala de projeção tecendo loas à genialidade do diretor, mesmo sem ter entendido nada do que ele queria dizer. Para mim o autor pode até inovar em seu estilo de escrever, fazendo parágrafos de cinco páginas, não colocando vírgula nem nenhuma outra pontuação, mas que tenha uma história pra contar. Pode até deixar o leitor na dúvida (e isso é bom) para que ele próprio fantasie e crie o seu final da história, mas que tenha uma certa lógica e encadeamento na escrita. Em tempo: é o meu gosto!

Começo a lista por Mario Benedetti, autor uruguaio, com o seu mais famoso romance, A trégua, publicado em 1960. É uma história de amor (as minhas preferidas e se tiver final feliz, melhor ainda) vivida por um viúvo de meia idade, tratando ainda dos difíceis relacionamentos humanos. O cenário é a bela Montevidéu, com a curiosidade do livro ter sido escrito durante cinco meses numa das mesas do café Sorocabana. A obra é considerada uma das mais importantes da literatura latino-americana contemporânea. Compartilho dessa opinião.

Depois desse vem A trança, de Laetitia Colombani, escritora francesa, contando a história entrelaçada de três mulheres, em continentes diferentes, tendo como ligação entre elas a mesma sede de liberdade. Uma trança e tanto...

Outra leitura que me cativou foi As brasas do húngaro Sándor Márai. É um belo romance sobre a amizade, a paixão amorosa e a honra, trazendo um enigma que só no fim da vida dos personagens será desvendado. Uma história e tanto...

Americanah, de Chimamanda Adichie, nigeriana, é um longo e intenso relato épico, com uma história de amor como pano de fundo, unindo a Nigéria, a Inglaterra e os Estados Unidos, palcos de amores conturbados e muita discriminação social.

Por fim, e tão importante quanto, as autoras brasileiras Carla Madeira e Marília Arnaud com os seus Tudo é rio e O pássaro secreto. As histórias de Lucy, Dalva e Venâncio, personagens de Tudo é rio, encantam pela sua prosa poética e, como disse alguém, Carla não escreve, borda. Já em Marília resplandece a personagem Aglaia, “fera ferida, no corpo, na alma e no coração”. No mais, um ano novo com muitas descobertas literárias para nós.

Fleal
Enviado por Fleal em 28/12/2021
Código do texto: T7416550
Classificação de conteúdo: seguro