Papagaio

Eu tive um papagaio. Daqueles das cores da bandeira do Brasil (Papagaio Verdadeiro). Nunca aprendeu a falar muita coisa. Porém, todas manhãs ao me ver, erguia as duas asinhas dobradas e falava antes de mim: “ei Lôro!”. Eu é que repetia o cumprimento. Aí ele emendava: “Cê tá bão?”. Para não subestimar sua inteligência, eu respondia: “tô bão, e o cê?”, ao que ele arrematava com um simples “bão”.

Quando criança, um amigo tivera um papagaio. Durante anos eu também quis ter um. Ficava me imaginando com um nos ombros, brincando e ensinando a falar. Como num conto de fadas – juro que é verdade – numa manhã apareceu o papagaio na varanda do meu quarto, gritando, pousado no gradil. Minha mãe chamou o vizinho para pega-lo. Muito solícito e inteligente, o saudoso senhor Antônio já adentrou a casa com um pano grosso em mãos e conseguiu puxar o bichinho de seu voo, pelas penas da cauda. Levou uma boa bicada, que sangrou muito, me lembro. Como nenhum aviso de papagaio perdido foi encontrado, ficamos com ele.

Foi difícil fazer amizade. Lembro-me do esforço para tentar tocar-lhe o bico, pois era onde ele demonstrava maior segurança à aproximação (obviamente, ali estava sua maior arma de defesa). No fim das contas, consegui sua confiança e nos tornamos amigos. Da família, somente eu tinha total liberdade com ele. Andava em minhas costas, subia das calças aos ombros e ficava ali, me coçando a cabeça com o bico. Em época de vestibular, passava as horas de estudo em meus ombros, observando o que eu fazia. Não se incomodava e até tentava ajudar, pegando caneta e lapiseira. O interessante é que, durante este tempo, aprendeu a avisar que queria ir ao banheiro. Eu sabia quando ele estava apertado. Levantava-me, com ele ainda nos ombros, ia até o poleiro e o deixava obrar. Ele descia sem desconfiança, fazia e voltava pra mim.

As outras pessoas da casa conquistaram um pouco de seu afeto. Mas precisavam sempre ser ariscos. Do contrário, levavam uma bicada surpresa, pois esse bicho é traiçoeiro! A mim nunca bicava. Ficava zangado comigo se eu passasse dois dias fora, ciumento que era. Quando eu regressava, ao me ver se punha em posição de bote. Eu me aproximava, já sabendo de seu ressentimento e abaixava a cabeça pra ele. Redonda e cheia de cabelos, o bico não conseguia a mordida mas vinha com força. Uma, duas ou três estocadas e pronto: eu estava perdoado. Levantava minha mão com um dedo estendido acima de seus olhos e ele já se arrepiava todo, sabendo da carícia que vinha, e abaixava a cabeça.

Li uma vez em alguns textos da internet que os papagaios são mesmo assim. Elegem um par para a vida, ou um dono favorito. São fiéis. Não sei se todos psitacídeos são dessa forma. Sei que amo a todos. Hoje em dia, não tenho mais um deles, mas certamente desejaria ter muitos! Quando meu Lôro morreu, lembro de ter chorado uma semana inteira. Vivem muito estes pássaros. Como ele chegou de surpresa, não soube nunca sua idade. Nem seu sexo. Reservado como ele só, não quis me contar. Só sei que ele foi meu melhor amigo pelo tempo que durou nossa relação. Está tudo gravado no álbum de minhas memórias.

Papagaio e outros psitacídeos – como os do gênero Agapornis (aves do amor), o Red-Rumped e a Calopsita – podem ser aves domésticas, silvestres ou exóticas. Não estou certo sobre as classificações de cada um ou sobre as leis do IBAMA para a criação em cativeiro atualmente. Se quiser ter um em casa, consulte o IBAMA e evite a desregrada exploração contra estes anjinhos de bico curvo.