Mocinho ou Vilão

De fato, o desvio de conduta é inerente ao ser humano, entretanto, quando somos sabotados pela falta de oportunidade ou pela hiperatividade dos excessos, qualquer um é passivo de erros. A bondade não é exclusividade dos sem recursos, assim como a maldade não é de quem nasceu em berço esplêndido.

Tudo é relativo. Mas, a expressividade dos índices é alarmante nas classes menos assistidas. Será a falta de dinheiro? Será o novo formato familiar onde a mãe é a principal provedora, ou a única? O ambiente transforma? A falta de exemplo, já que a direção não pode ser só pelo discurso?

A falta de políticas públicas de distribuição de renda? Tenho lá minhas dúvidas, pois vim da periferia e tenho vivências e experiências na realidade que apresento nos escritos. Não é ativismo de classe, nem justiça para os menos favorecidos, tampouco marginalização dos valores.

Não se trata de campanha assistencial. A escassez de oportunidade não é justificativa para as escolhas erradas, nem filosofia de vida baseada no refrão do hino nacional(deitado eternamente em berço esplêndido), isso remete-me ao comodismo, e o homem é um animal racional, ou seja, escolhe fazer, não é obrigado.

O que inviabiliza a condição de coitado para as práticas criminosas, violência e atos de vandalismo. Nada é determinístico, e qualquer indivíduo pode estar propenso ao erro. Quando o filho do rico comete um crime, choca porque, em tese, ele foi criado numa redoma de dinheiro, e para alguns opiniudos, o dinheiro é indicador de conduta. Discordo.

Somos imperfeitos, nada justifica, principalmente, quando o filho do pobre é classificado como mocinho pelos caminhos tortuosos. Sou um exemplo da classe baixa, e não escolhi ficar sem estudar, capacitei-me, fui à luta e venci. Cada caso tem suas particularidades e nuances, e a vida não é um parque de diversões, literatura infantil ou faz de conta.

Quebrar paradigmas é um fator importante para quem nasceu sem nada. O que tenho visto muito é o gosto pela vida fácil e o empoderamento através da força. Comandos paralelos e subversão da ordem. Não existe sociedade sem regras e normas. Uma coisa é a conduta, outra é o desinteresse do estado para com a massa. E a massa não deve comportar-se como rebanho.

Tem que estudar para ter conhecimento, e através dele combater a desigualdade. Mesmo com a deficiência do ensino público, com a desnutrição dos recursos, com a ineficiência do estado quanto garantidor dos direitos, é possível vencer e mudar a realidade. Conhecimento é uma riqueza incalculável, mesmo que você divida, nunca será pobre. Nunca me aceitei como coitadinha, e ver-me como incapaz, pior ainda.

Agora, um ambiente familiar aceitável – não disse perfeito – é um diferencial, e a falta do vintém não me fez desistir, ao contrário, foi um incentivo. Voltando ao assunto do ambiente contagioso, acho que fiquei imune, pois vivenciei tantas violências, de todos os tipos e não matei meus sonhos. Também sonhei alto, nada inatingível, a exemplo de riqueza advinda do trabalho, contudo, uma vida confortável, conhecimento para ter o poder da barganha e dias com momentos românticos.

Confesso que não tiro o subúrbio dentro de mim, mas retirei-me de lá para ter outras experiências. Criei minhas oportunidades e manias. Não sou mocinha ou vilã, dona da minha história, com certeza.

Jaciara Dias
Enviado por Jaciara Dias em 26/02/2022
Reeditado em 26/02/2022
Código do texto: T7460576
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