A RAZÃO NA IRRAZÃO, O SOCORRO NO APOCALIPSE

Notícias advindas dos quatro pontos cardeais alertam para fluxo ou fenômeno histórico da (des)humanidade envolta pela tecnologia nos antológicos três dias de escuridão. As massas desconhecem seu lugar no mundo, ignoram existir, sobrevivem a migalhas de hipocrisia tornada no pão de cada dia. A superficialidade cotidiana denuncia que os “heróis morreram de overdose eh, meus inimigos estão no poder

Ideologia, eu quero uma pra viver” (Cazuza). Se quem pensa existe, o espelho da ética denuncia os horrores e barbáries, a notoriedade conjuntura daquilo tudo que o homem fez, deixou de fazer, observar, tentar compreender como erros cometidos fomentados no superego. Em sua obra Fim dos Tempos, Slavoj Zizek trata dessa situação pelas trincheiras da filosofia: “O sistema capitalista global aproxima-se de um ponto zero apocalíptico. Seus ‘quatro cavaleiros do Apocalipse’ são a crise ecológica; as consequências da revolução biogenética; os desequilíbrios do próprio sistema (problemas de propriedade intelectual, a luta vindoura por matéria-prima, comida e água) e o crescimento explosivo de divisões e exclusões sociais” (2010).

A reflexão adentra ao direito constitucional da Educação, velho estandarte em frangalhos, bordado a arte como ferramenta de transformação. Questão de ética transformada em missão, e do amor a perseguir o ideal, remete ao educador Paulo Freire, em seu Centenário, o qual trabalhou alguns aspectos que constituem a Pedagogia do Oprimido: “[…] aquela que tem de ser forjada com ele, enquanto homens ou povos, na luta incessante de recuperação de sua humanidade. […]” (2005, p. 34). Em se tratando de educação, não se pode fugir à trincheira da Academia, não sem antes questionar os valores, os propósitos, as mensagens subliminares nos elogios, afagos, títulos, notas de rodapé. A Era Covid redirecionou a escola virtualizada. “El concepto de resiliencia se ha convertido, en forma lenta pero firme, en un tema de gran interés para la Academia. En los últimos años se han llevado a cabo numerosas investigaciones en torno a ella, en el intento de conceptualizarla, esencialmente en Psicología con el objetivo de utilizarla tanto en la prevención como en el tratamiento de distintas patologias” (Eduardo Camín, jornalista uruguaio, ONU). Enquanto a academia coloca flores sobre a bancada, a mesa de milhões de trabalhadores esvazia, o capitalismo torna fetiche a oportunidade de viver com dignidade.

Num quarto escuro, milhares de avós sonham com o passado, pálidas, trêmulas, fracas, roubadas no maior dos direitos que é o alimento, seguido de necessidades básicas tais como o medicamento, o básico insumo das categorias forçadas a acordar e dormir na cama da cruel realidade. No Brasil, o Estatuto do idoso - Lei no 10.741/2003 dispõe: “Art. 2o O idoso goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhe, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, para preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade”. Os governantes honestos, a mídia coerente e os humanos conscientes desconhecem que “o envelhecimento é um direito personalíssimo e a sua proteção um direito social, nos termos desta Lei e da legislação vigente (Art. 8º). E mais, que “é obrigação do Estado, garantir à pessoa idosa a proteção à vida e à saúde, mediante efetivação de políticas sociais públicas que permitam um envelhecimento saudável e em condições de dignidade” (Art. 9º). Em se tratando de luta de classes, vida e morte de categorias, o revide é natural, os seres digladiam-se como zumbis. Necessário se faz entender que o status quo econômico, político e social do idoso sucumbe ao ego do mais novo, poderoso, forte.

A notícia do dia conta da cultura, educação, ética e arte amordaçadas, colocadas como pano de fundo, obrigadas a assistir na condição de bestializadas o triste fim da quinta raça humana. Em A situação humana, Aldous Huxley trata da segmentação do ensino em disciplinas separadas, sem que exista transversalidade, disseca o aprendizado altamente especializado que pode conduzir à perda da visão panorâmica dos problemas, dificultar encontrar soluções para as questões dos homens em geral (1959). E alerta acerca da devastação que o homem promove no Planeta, trazendo à luz da discussão a criação de regiões desérticas causadas pela pecuária extensiva. Sobre tal catástrofe, denunciada no limiar do século XX, afirma que “depende de nós decidir se essas conquistas da natureza e do conhecimento devem ser usadas para fins terríveis e desumanos ou ser empregadas para criar o progresso sonhado, ou, o progresso que a humanidade jamais sonhou, pois as potencialidades que agora divisam jamais estiveram presentes antes na história do Mundo” (1959).

A questionar a conjuntura globalizada por lentes e olhares que buscam a verdade, depara o pensamento com a mórbida realidade construída a prazer, consumo, tecnologia e apressados cavaleiros apocalíticos. A angústia grita, a ansiedade corrói o coração, a fake News remunera a propaganda, o ódio bebe no vaso raso da frieza. Aonde vai a (des)humanidade se “cada um de nós é, sob uma perspectiva cósmica, precioso? Se um humano discorda do outro, deixe-o viver, em 100 bilhões de galáxias, um não vai reencontrar o outro”, e reflita o leitor, entre a razão na irrazão, o socorro no apocalipse, bilhões de olhares inocentes buscam, na promessa, a “verdade” imersa nas sensações efêmeras, relações virtualizadas num “Universo que não parece ser nem benigno nem hostil – apenas indiferente” (Carl Sagan). Aos mais céticos, afeitos aos números, lembra a Terra que sangra, já não haver muito mais o que segurar, além de ser “um fato notável que os parâmetros numéricos do Universo pareçam ter sido ajustados cuidadosamente para tornar possível o desenvolvimento da vida” (Stephen Hawking).

Dhiogo J Caetano, Antonio Lopes - Escritor, filósofo, professor, mestre em Serviço Social e doutor em Ciências da Religião PUC-Goiás.
Enviado por Dhiogo J Caetano em 10/03/2022
Reeditado em 10/03/2022
Código do texto: T7469476
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