MEU AMIGO CHARLIE BROWN

 

Tenho uma mania de sonhar com personagens de História em Quadrinhos. É a forma que meu psiquismo às vezes encontra pra resolver, de forma bem humorada, as angustias e dificuldades do dia-a-dia. Como se tivesse mostrando que a melhor maneira de encarar o limão nosso de cada dia, é fazendo uma bela limonada. 

Transformo, por exemplo, pessoas temperamentais ou destrambelhadas em Patos Donalds e depois disso, consigo lidar bem com elas. Pessoas desligadas e distraídas transformo em Patetas; mulheres coquetes ou ingênuas, em Bettys Boops; amigas bravas e malcriadas em Mônicas (do Cebolinha), e por aí, vai... Constantemente depois desses sonhos, acordo gargalhando e achando que, como me disse um amigo outro dia, a vida não passa de uma História em Quadrinhos.

Esta noite sonhei com Charlie Brown, menino sensível, tolerante e reflexivo, preocupado com os outros e com o mundo, dono de um cachorrinho chamado Snoopy, cuja  personalidade  é de uma irreverencia filósofal. 

Acordei no meio da noite, sorrindo e cantando uma velha canção de Benito de Paula que dizia: “Ei, meu amigo, Charlie, ...ei, meu amigo Charlie Brown... se você quiser, vou lhe mostrar, a nossa São Paulo terra da garoa, se você quiser, vou lhe mostrar, o Rio de Janeiro, nossa gente boa...”.

Depois, de manhã, lembrei-me do sonho e fiquei a matutar quem eu havia transformado em Charlie Brown. Imediatamente veio-me uma recordação muito boa de alguém com quem eu convivi a maior parte de minha vida e que, além de ter representado coisas muito importantes para mim, foi também, meu melhor amigo. 

Essa pessoa me rodeava de atenções, carinhos e considerações e eu, muitas vezes, o tratava como a personagem Lucy tratava seu amigo Charlie Brown. Cheia de questionamentos e praticidades, colocando-o  sempre na berlinda, desafiando-o a responder suas questões existenciais e filosóficas.  Assim como Charlie Brown, meu amigo também levava tudo o que eu falava muito a sério e trazia-me respostas, senão sempre convincentes, na maioria das vezes, confortadoras. 

Hoje em dia, percebo, que era aquele aconchego e cuidados que ele tinha para comigo, que me deixava sempre bem e com a ilusão da serenidade e segurança.

Aprendi muito com este amigo, pois o que ele trazia como resposta para minhas angustias era sempre uma mensagem de coragem e luta, e com isto alimentava a minha esperança. 

A última mensagem que ele me deixou foi de um texto de Guimarães Rosa que diz:  “O CORRER DA VIDA EMBRULHA TUDO. A VIDA É ASSIM: ESQUENTA E ESFRIA, APERTA E DAÍ, AFROUXA, SOSSEGA E DEPOIS DESINQUIETA. O QUE ELA QUER DA GENTE É CORAGEM.”

Hoje este amigo, não está mais aqui, mas sempre será o “meu amigo Charlie Brown”, que mesmo em sonhos, sempre me trará uma mensagem de confiança, coragem  e amizade, e me fará sempre sorrir.

Obrigada meu amigo Charlie Brown !  

Rio, nov/2007