SABER OUVIR É UMA ARTE

Prof. Antônio de Oliveira

– Bom dia, cumpade! Vosmecê não me vende o seu louro, digo, o seu papagaio?

– Claro que sim. Tudo depende de combinar.

– Isso mesmo. Mas combinar o quê, além do preço e das condições de pagamento...

– Como assim? Louro está em perfeitas condições de saúde, segundo consta.

– Mas tem uma coisa. Ele fala e canta. É justamente por isso que eu quero adquirir ele...

– Sim, mas e a mania, qual é?

– A mania é que ele passa dias sem cantar nem falar. Esquisito, não?

– Deixa cumigo. Eu vou me entender com ele.

E lá se foram o novo amo e o papagaio. Silencioso. Passaram-se uns quinze dias e o papagaio... nada de falar nem de cantar. Reclamou, então, o adquirente ao ex-dono. Que assim se justificou. Mas tem uma coisa, cumpade, quando vosmecê fala com ele, ele presta muita atenção, num presta? Então, sinal de que é inteligente...

Provavelmente, o vendedor, de vendedor passara a bom raciocinador.

Na verdade, falar é uma faculdade própria do homem. Escutar é uma arte.

Numa Semana Santa tradicional, o efeito produzido pela música barroca é muito maior do que essa mesma música ouvida longe da exuberância de uma cerimônia litúrgica com suas imagens, turíbulos em brasa, aroma inebriante de ervas-de-cheiro, andores enfeitados, cheiro místico de incenso. Machado de Assis, num Ofício da Paixão, se deixou “embalar pela música e inebriar pelo incenso, duas fortes asas que levam de oeste a leste”. Bem-aventurados os simples que deixam seu coração voltar sempre à simpleza antiga porque sabem ouvir com o olhar. Quem vê a banda passar enxerga a música passa

Antônio Oliveira MG
Enviado por Antônio Oliveira MG em 17/05/2022
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