Das Minhas Lembranças 30

Creio que foram dois evento ocorridos na infância, que despertaram a minha consciência ambiental. O primeiro foi ao ver meu pai surrando um boi, que não aceitava a canga. O frágil animal apanhou tanto, que vi lágrimas escorrerem de seus olhos e dos meus. Pouco tempo depois ganhei do Edson, filho de "Seu" Tatão, uma gaiola com alçapão e um canário chapinha, Tinha lá os meus nove anos. O Edson me instrui o que fazer: colocar a gaiola no galho de uma árvore, que o canarinho iria cantar e atrair uma fêmea ao alçapão. Assim fiz, num local distante da casa, próximo de um córrego. Criança distraída, esqueci da gaiola no mato. Depois de uns dias, lembrei-me do pobre pássaro e da gaiola pendurada. Corri com o coração pulando, na esperança de salvar o canário. Em vão. Estava lá na gaiola, caído de barriguinha para cima, morto de sede e fome. Jurei nunca mais prender pássaros. Bem antes desses dois eventos, tive outra decepção com um papagaio. O louro espalhava alegria pela casa. Me lembro bem de sua algazarra. Chamava-nos pelo nome, inclusive o cachorro Peri. Uma de suas farras, era dar um pouco de sua comida às galinhas. Ele as chamava, imitando minha mãe, quando dava milho às galinhas: prutiti, prutititi, pruttiti. Elas chegavam debaixo do poleiro, em seguida o louro ciscava, jogando a comida ao chão. Ato contínuo, chamava o Peri e gritava: pega nego, pega nego. O cachorro assustava as galinhas, com latidos ininterruptos. O Louro caía na gargalhada. Na primeira vez que ele saíra de casa, a gente o encontrou na estrada, voltando para casa, à pé. Na segunda vez não retornou mais. Todos ficamos tristes.

Carlos, meu irmão caçula armara umas vinte arapucas e as espalhava no cafezal, para pegar Fogo Pagô (Rolinhas), com a finalidade de fazer umas paneladas. Algumas inocentes juritis, também era presas. O mano dava uma pequena paulada nas cabecinhas das aves, depenava e as fritava. Achava aquilo uma monstruosidade, a ponto de eu ir à lavoura e desmontar as arapucas.

Dando um salto no tempo, chego a Contagem em 1972, em busca de emprego, quando vou morar na casa de meu irmão, Altair, que acolhia a todos da família em fuga da dura lida no campo. Ele morava próximo da fábrica de cimento Itau, que despejava na atmosfera, toneladas de pó de cimento. O mesmo acontecia com a Mannesman, no Barreiro, em Belo Horizonte, na divisa com Contagem. O Altair tirava do forro da casa, litros de pó de cimento. Todo esse pó causava sérios danos à saúde dos moradores próximos dessas fábricas. Não cheguei a participar, mas havia um movimento de moradores contra a poluição, que levaria, tempos depois ao fechamento da cimento Itau e a Mannesman colocar filtros antipoluentes.

Esses eventos contribuíram muito para, anos depois, me engajar no movimento popular e ambiental, quando me tornaria um dos fundadores da Casa do Movimento Popular de Contagem, presidente da Associação dos Moradores do Bairro Industrial - ACBI, conselheiro do meio ambiente de Contagem - COMAC e militante da Central de Movimentos Populares - CMP

Sobre a minha participação nesses movimentos, narrarei nos capítulos seguintes.