Sobre farrapos e mantos

Eu sei lidar com o que machuca.

Como uma boa pisciana, sei conviver com a decepção, com a tristeza e com as lágrimas.

Sou capaz de encontrar a música ideal para embalar as diversas feridas do coração.

Consigo selecionar os melhores vocábulos e ordená-los, num texto, pra traduzir todas as dores que sinto.

Sim, eu sou boa em sofrer.

Mas… e agora?

Sinto que, pra ser feliz, eu não estava preparada.

Como acostumar-me com a inteireza que, vorazmente, preenche meu peito, vazio até então?

Como não estranhar a capacidade do meu cérebro de dormir e acordar tendo, diariamente, nos pensamentos, um único protagonista?

Como aceitar que, mesmo inesperadamente, é possível receber tudo aquilo que, sempre, se julgou capaz de dar?

Não há saída.

É preciso reconhecer que a felicidade é uma roupa que, surpreendentemente, me cabe.

Desfaço-me, então, dos farrapos que, previsivelmente, cobriam meu corpo e meus dias e arrisco-me a abrigar-me sob o desconhecido manto do amor.

Coberta de coragem, decidi atirar-me nas águas do infinito mar que se abre à minha frente.

Uma nova vida me espera.