As lições dos filmes

Vejo menos filmes do que deveria e gostaria. Até pensei que, com mais tempo para o ócio, me dedicaria mais intensamente a essa atividade. O passado sinalizava para isso. Na juventude qualquer dinheirinho que aparecesse era destinado ao escurinho do cinema, mesmo que fosse apenas para o ingresso, sem o acompanhamento do “drops de aniz”. Estar ali já era tudo. Até porque tinham as emoções das séries a serem acompanhadas, pois como “toda fita em série que se preza, dizem, reza, acaba sempre no melhor pedaço”, queria ver como o mocinho se desvencilharia da encrenca em que havia se metido no episódio anterior. É claro que havia outros motivos, mas isso já era suficiente para marcar o encontro do próximo final de semana. Mas agora, já sem as séries que nos prendiam, e os outros interesses aplacados, ainda tem a seletividade na escolha dos filmes, que me faz optar por outros gêneros cinematográficos. Desta vez são as comédias românticas, e sobretudo aquelas que têm um final feliz, que me animam a sair de casa ou a ligar a TV para assistir. E nem faço força para segurar as lágrimas.

Digo isso porque não me arvoro a ser nenhum crítico de cinema, que vai aos filmes para procurar em que parte o diretor falhou. Não! Vou ao cinema em busca de emoção. Uma boa trilha sonora já ajuda muito. E, claro, uma história bem contada, com começo, meio e fim. Não vou ver nenhum filme pela “grife”. E nem vou assisti-lo com a opinião formada, só porque é dirigido por um nome cultuado.

Assim é que, vez por outra, dando um tempo no feitio de algo também prazeroso, como a leitura, costumo passear entre os canais, em busca de algo que venha ao encontro do meu gosto. E foi aí que eu me deparei com o filme, Tinha que ser você (Last chance Harvey), com Dustin Hoffman e Ema Thompson (não vejo a hora de assistir Boa sorte, Leo Grande). A fita é de 2008, portanto já bem rodada nos tele cines da vida. Trata-se da história de um pai (Dustin) que vai a Londres para o casamento da filha, fruto de uma relação finda. Após a separação ele continuou morando na mesma cidade, enquanto a ex-mulher foi para Londres com o novo marido, levando consigo a filha. Com isso o padrasto assumiu o papel afetivo de pai. Após o reencontro com a filha, ela o chama para uma conversa reservada e aí vem a “bomba”: pela relação de afetividade que havia construído com o padrasto, gostaria de ser conduzida ao altar por ele, em vez de ser levada pelo pai. É claro que ele só tinha que concordar, mas muitas reflexões ele fez, a partir daí. E eu também! Para mim bastou essa cena para o filme me pegar. As lições de empatia bateram forte. E outras situações da relação pai x filhos me vieram à mente. Mesmo o “alter ego” tendo me alertado que a ausência do pai deve ter sido tão marcante que o seu lugar foi ocupado – e bem - pelo padrasto, não me fez deixar de imaginar uma solução conciliatória que contemplasse, de alguma forma, esse pai.

Costumo tomar partido pelo lado que acho mais frágil. Não deixa de ser o meu lado mais sensível se manifestando e que tem me acompanhado, mais intensamente, depois dos setenta. Continuo achando que é sempre tempo de uma reconciliação, de colocar as conversas em dia, mesmo tendo que chamar à razão. Preocupa-me a forma como isso acontece. E, entre todas elas, para mim, a que é tocada amorosamente, vai melhor. Ah! os filmes...

Fleal
Enviado por Fleal em 09/08/2022
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