Cama Elástica

No dia 29 de Julho, eu me lembrei do prazo final para envio de relatório de atividades do trabalho. Era tarde e eu me lembro de ter pensado: "vou enviar antes que me esqueça". No fim do expediente, ainda não havia enviado o bendito relatório e pensei "em casa, envio". Mas não fui para casa naquele dia. Era uma sexta. No dia seguinte, pensei "eu tenho que enviar o relatório, mas é sábado, nem sei se eu posso mexer no sistema no sábado... passou um dia do prazo". Não enviei (o prazo de verdade era 31 de Julho, mas eu nem sabia disso).

E assim foi até hoje, dia 09 de Agosto, quando estava na porta da casa de uma amiga esperando ela chegar e recebi uma mensagem de uma companheira de trabalho com a foto de uma notificação dizendo que não se apresentasse o relatório até 10 de Agosto, perderia o meu emprego - e as implicações de perder esse emprego seriam tantas na minha vida que eu senti o mundo parar de girar e tomar o rumo contrário. Comecei a andar de um lado para o outro na rua, com o coração meio fora de compasso e a pressão baixando. Parece mentira, mas eu realmente foi irresponsável a esse nível: quase perder o emprego por conta de um mísero relatório que estava pronto e não foi enviado - e porque eu não li direito as regras do jogo.

Antes de me autoconsumir na guerra entre a autocomiseração e autoflagelação, o pensamento que me atingiu como uma flecha foi: "primeiramente, falhei com o Espírito de Deus". Senti minha feição mudar.

Parece que não tem nada a ver, eu sei. Meu segundo pensamento (quase) foi: "estou pegando pesado demais e levando isso a níveis extremamente absurdos". Mas o segundo pensamento verdadeiro foi: "que dor, é verdade". Uma avalanche de memórias me atingiu: o pensamento de enviar o relatório me ocorrendo diversas diversas durante o último mês, o relatório aparecendo meio "do nada" em cima da mesa, a decisão de tirar uma cópia e deixar em casa e o fato de ter achado a cópia no sábado de manhã, véspera do (real) prazo final. Pequenas memórias de sinais claros. Uma grandessíssima metáfora.

A lógica da falha com o Espírito de Deus consiste no fato de que eu sei muito bem quem me lembrou de enviar esse relatório - não só no dia 31 de Julho, mas desde o dia 06, quando ele foi elaborado. Eu também sei quem milagrosamente me proveu um emprego que permitisse que eu me dedicasse à outras demandas, desse conta da faculdade, conseguisse viajar e visitar familiares, fizesse uma escola ministerial e estivesse nas reuniões da igreja, viajasse para os congressos e fizesse os intensivos. Eu sei quem é o meu amigo, que tem me aconselhado e guiado nas pequenas e nas grandes coisas. E sei que ouví-lo teria evitado que chegasse à beira da perda. Se eu tivesse perdido o emprego, seria mais que merecido. Seria o resultado naturalístico e justo das minhas próprias ações.

Então eu pedi perdão, ali na rua mesmo. Me deram prazo até dia 10! Graças a Deus, Fui ainda mais constrangida pelo meu não-merecimento de uma nova chance enquanto a minha companheira de estágio resolvia tudo por mim e enviava o bendito relatório. No fim das contas, nem fui eu que resolvi o problema. Enquanto escrevo, estou aguardando a confirmação de recebimento da Diretoria.

Por causa de mim, quase perdi o que ganhei. Quase joguei fora um mundo de provisões e uma excelente oportunidade, já que eu ganharia uma péssima anotação no currículo - e eu estou na área exata e com a carga horária exata que preciso para a aplicação de mestrado, que correria o risco de ir por água abaixo. Minha única atuação nessa história - que só poderia render benefícios ou malefícios a mim mesma - foi atrapalhar.

A verdade sobre mim é que, por vezes, eu só atrapalho.

A parte boa é que tenho duas grandes amigas que parecem muito relutantes em se despedir dos meus dias: graça e misericórdia. Misericórdia é não receber a punição que eu mereço, graça é ganhar a recompensa que não mereci. Se eu errar de novo, vai ter uma cama elástica extremamente potente embaixo do precipício no qual eu me desequilibrar: não só para me receber na queda (misericórdia) mas para me lançar de volta para cima (graça). Depender de Deus é seguro, dentre tantas outras razões e motivações, por isso.

Se dependesse de mim, a morte já teria reinado há muito tempo.

Dependendo de Deus, ainda que eu seja competente (às vezes acontece, luto para ser), minha competência não é o que define minha vida. Deus não erra. Estou salva - e isso não significa um emprego que vá durar para sempre, mas significa qua