Acervo inútil

ACERVO INÚTIL

Miguel Carqueija

 

Na minha modesta opinião o mundo das últimas décadas avançou a passos rápidos demais, e coisas que na aparência tinham vindo para ficar, simplesmente foram descartadas. Coisas que um dia eram importantes em nossas vidas.

O filme super-8, o disco de vinil, depois as fitas de vídeo (VHS) e finalmente até o DVD e o CD, o fato é que agora as coisas somem antes mesmo que esquentem o lugar.

Na minha família não havia toca-discos e portanto nem o hábito de comprar discos, exceto quando meu pai ganhou um conjugado que incluía vitrola, e um ou outro disco apareceu. Mas eu mesmo só fui me interessar em ter discos graças à Rita Pavone, pelo meu interesse crescente por ela a partir de 1964. Mesmo assim, só comprei um LP dela em 1968. Daí, e durante muitos anos, fui acumulando gravações em LP ou compactos. Para quem não sabe, LP (abreviatura de “long-play”) era o álbum de vinil em geral com 12 faixas musicais, 6 de cada lado. Os compactos eram discos menores, com uma ou duas canções em cada face.

Acabei acumulando um bom número desses discos, e com excessão dos de Rita Pavone, a maioria eu adquiri em sebos ou saldos, já que sou pessoa de poucos recursos. E assim reuni LP’s e compactos de muita gente: Celly Campelo, Ray Conniff, Elvis Presley, Fagner, Elba Ramalho, Agnaldo Timóteo, Ronnie Cord, Diana Pequeno, Bia Bedran, Paul Mc Cartney, Moacir Franco, Carpenters, Francisco José, Brenda Lee, Teddy Reno, The Platters, Frank Sinatra, Johnny Rivers...

Nessa coleção há dois itens bastante diferentes, que parecem elepês mas não são, pois não apresentam faixas musicais. Um disco do naturalista Dalgas Frish, com gravações de animais da Amazônia (inclusive o uirapuru) e outro do Professor Osvaldo Diniz Magalhães, que durante muitos anos apresentou um programa de ginástica no rádio.

Esse álbum da ginástica mostrei uma vez a uma amiga, e ela disse ter ficado cansada só de escutar...

Mas o último toca-discos que eu tive estragou há muito tempo e hoje até os CD’s foram substituídos pelas plataformas, pelo youtube. E assim fiquei com um acervo inútil, discos mudos, que não podem ser vendidos, pois ninguém compra, e nem mesmo dados, pois ninguém quer nem de graça. Quase ninguém dispõe de vitrola hoje em dia, e para converter vinil em CD custa dinheiro e pode nem valer a pena, pois as canções podem ser acessadas na internet... e com imagens.

É, gente. Antigamente chamava-se isso de “um busílis” — palavra que também caiu de moda.

 

Rio de Janeiro, 18 e 19 de agosto de 2022.