O SOM DO SILÊNCIO

A gente só tem certeza de que está ficando velho quando começa a ficar saudosista, então dá a repetir a ladainha “no meu tempo...”. Digo, porque também faço isso, mas ouvi essa frase um dia desses de um conhecido, falávamos sobre educação e ele me veio com essa: “no meu tempo, o professor era autoridade e a sala de aula, um silêncio”. Discordei prontamente, argumentando que no tempo dele, a escola não era para todos e que o que se tinha era autoritarismo, não autoridade. No fim da prosa cada um saiu com sua razão, mas fiquei ruminando o que ele disse.

O silêncio na sala de aula, infelizmente, ainda é visto como pré-requisito para um bom professor. Muitas vezes, até o próprio professor acredita nesse absurdo e penitencia os estudantes com essa ideia. Aí é aquele embate desgastante que conhecemos e que não é produtivo para a aprendizagem... É claro que a disciplina é importante, em um ambiente caótico é impossível aprender, mas há o falatório produtivo, criativo. É esse “barulho” que tem que ser estimulado, planejado e organizado. Cada vez mais os jovens têm dificuldade para emitir uma opinião de forma eficiente, sem fazer uso de palavras de baixo calão ou sem apelar para gritaria. Isso se deve ao fato de que debates, seminários, círculos de conversa não fazem parte do fazer pedagógico de muitas escolas.

O educador pernambucano Paulo Freire já alertava para isso, quando disse “não é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão” é preciso que a palavra seja uma ferramenta imprescindívelao ensino. A palavra viva, aquela que é capaz de permitir o encontro, a palavra que leva à ação, não ao silêncio, pois o silêncio só traz a resignação. É preciso que nossos estudantes conheçam a força das palavras, que saibam o seu poder de sedução, que entendam o perigo que elas podem representar, que tenham habilidade para manejá-las em suas diversas funções, seja de docilidade ou sua malícia.

Já li, certa vez, que os bichos na mata não conhecem o silêncio, até o desabrochar de uma flor é captado e sentido por eles. Nisso temos que ser como os bichos, entender o quanto de aprendizado existe em cada ruído. É preciso que tenhamos um novo olhar à Educação, um olhar em que seja possível compreender que somos feitos de linguagem, onde as aulas não sejam centradas na fala de um só, mas que deem condições para que os alunos possam aprimorar esse instrumento de transformação social, essencial para a vida, que é a palavra.

Gosto sempre de começar o ano solicitando que a turma se apresente, peço para que falem sobre si mesmos, sobre o que consideram uma qualidade neles, o que o fazem se sentirem inseguros etc. Para meu espanto poucos conseguem falar e mesmo os que o fazem apresentam muita dificuldade. Certamente porque estão acostumados a responder questionários, a fazer resumos escritos, mas não foram ensinados a falar de si mesmos, a ter naturalidade em se colocar em público a enfrentar a timidez. Por isso somos tão travados, crescemos com tanto medo de nos expor. É bem verdade que as demandas da escola já são muitas, algumas até que deviam ser exclusivas da família, mas que acabam ficando a cargo da escola, mas não podemos continuar formando reprodutores, chegou um tempo em que temos que dar a palavra para que a história de cada um possa ser contada.