Medalha Hélio Costa

Medalha Hélio Costa

Saudações

Digníssimas autoridades, são muitas, por favor, sintam-se todos saudados, sem distinção de ordem e prioridade. A exceção é para os integrantes da mesa Juiz de Direito, Diretor do Forum, Presidente desta solenidade Dr. Roberto Troster Rodrigues Alves, juiz titular da Comarca, e o meu dileto colega de turma e muitíssimo amigo e guru, juiz cooperador da Comarca Dr. João Cláudio Theodoro; o Sr. Prefeito Municipal José Pocai e ...., para os quais dirijo os meus especiais agradecimentos.

As autoridades civis, militares e eclesiásticas, meus queridos amigos e familiares.

Srs. e Sras., este pequeno – tranquilizem-se todos – este pequeno discurso teve um nascimento mais difícil do que o de todas as minhas decisões, sentenças e alguns textos/artigos acadêmicos que escrevi na vida. Os amigos mais próximos sabem que sou um semialfabetizado digital, e, como sempre digo, ‘caipira veio ao mundo só prá sofrer’, eis-me o exemplo, pois continuo a depender de meus colaboradores a ensinar e corrigir minhas produções: a gravidez deste discurso foi de alto risco, e em muitas ocasiões perguntei-me se chegaria ela a termo. Ao invés do desejo por comidas exóticas, instalava-se em mim um estranho sentimento, uma espécie de inveja da posição confortável dos colegas que dominam a arte de escrever e falar.

Sim, das entranhas convulsas provinha a convicção de que elogiar – mesmo quando o objeto dos encômios definitivamente os não mereça – elogiar é muito mais fácil do que agradecer. Muito mais fácil. Recordemo-nos da desenvoltura com que Erasmo elogiou a loucura, sem deixar de nos espicaçar nela incluindo os jurisconsultos que segundo ele “amontoam glosas sobre glosas, citações sobre citações” e ainda “julgam-se os primeiros sábios do mundo”... E o que pensar de Calamandrei, que lepidamente conseguiu elogiar todos os juízes, todos eles, até aquele que dorme durante a sustentação, no qual descobriu prodigiosamente a virtude da discrição por deixá-lo “à vontade para discorrer sozinho, comigo mesmo, quando meu discurso já não o interessar”.

Foi essa descoberta, de que elogiar é muito mais fácil do que agradecer, que finalmente precipitou o parto, ou melhor, a cesariana, já que na confusão puerperal prevaleceram os meios cirúrgicos artificiais sobre os procedimentos naturais na vinda ao mundo do discurso.

Sinto-me muito honrado em receber a Medalha Desembargador Hélio Costa, a mais importante condecoração do Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Presidi muitas solenidades de entrega da comenda. Tamanha distinção, nunca foi por mim esperada.

Ao adentrar nessa Casa da Justiça de Primeira Instância, tenho uma sensação pessoal de profunda nostalgia, de alegres e saudáveis recordações. Retorno ao tempo, quando dando prosseguimento na minha jornada judicante travei conhecimento com a gente boa e laboriosa. Aqui conheci promotores, advogados, serventuários, autoridades municipais e o mais importante os jurisdicionados montesionenses, e mantendo um laço terno e gratificante da amizade. Fiz amigos dentre todas as classes: serventuários da Justiça, do Ministério Público, da Defensoria Pública, Advogados, Estagiários e Terceirizados. Hoje, passados 06 anos que deixei a Comarca em razão de promoção, mais uma vez me surpreendo com o carinho e a amizade dos amigos do Fórum que, agora, concede-me outra honraria, a “Medalha Desembargador Helio Costa”, destinada, repito, a agraciar as pessoas que se dedicam à causa da Justiça. Sinto-me honrado e envaidecido desta homenagem, tendo em vista que o patrono dessa Medalha foi um exemplo de magistrado que amou o direito e que sempre soube distribuir a Justiça com absoluta honradez.

Ao receber a comenda que leva o nome do maior de nossos ilustres jurisconsultos, começo por homenageá-lo, pelo exemplo que nos legou, de homem que sonhou alto por sua terra, procurou os meios de realizar seu sonho e, levado ao máximo seu infinito desejo de servir-se a Minas Gerais distribuindo justiça.

Agradeço ao Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais e aos membros da Comissão, pela indicação unânime de meu nome para recebimento desta honraria. Saibam, de público, que muito os admiro, muito embora, desta vez não obraram com o devido acerto de outras vezes, pela honra imerecida com que me distinguiram, outorgando-me a venerável medalha Hélio Costa, pois em melhores condições do que este homenageado, muitos outros estão em condições superiores a minha para serem agraciados.

Mas, quero dizer que esta é uma Comarca de sorte, pois no passado, como no presente, sempre teve Magistrados, Promotores e Servidores de escol, timoneiros firmes, que sempre encarnaram o ideal de Justiça. Feliz a Comarca que pode entrar com Magistrados da estirpe dos Doutores, Edson Zampar Júnior, Laurem Gomes Tenório, Maurício Ferreira, João Veríssimo, Paulo Cássio, Wagner Guerreiro e José Luiz Gonçalves, que, aqui chegando, rapidamente passaram a ser credores do respeito e da admiração de todo o povo honrado desta terra.

Busco, no fundo do meu coração, o agradecimento por este momento de alegria que me proporciona.

Ao representante do Ministério Público nesta Comarca, Dr. Marco Antônio Meikein, é para ele as minhas primeiras palavras de agradecimento. V.Exa., Dr. Marco Antônio, meu amigo fraternal, de cujo convívio recolhi lições, tem um coração tão grande quanto o seu corpo. Para V.Exa., em razão de sua atividade profissional exercida com esmero, denodo e competência, sobretudo, apesar de divergências naturais em razão de posicionamento jurídico, nunca faltou com o seu incentivo, apoio e solidariedade nas questões complexas que estiveram para decisão. E foram muitas decisões que chamaram a atenção da opinião pública deste Reino Encantado.

Agradeço ao colega, presidente desta solenidade, Dr. Roberto Troster Rodrigues Alves, a quem tive a satisfação de conhecê-lo neste evento e, com certeza, aqui terá a oportunidade de dar vazão a todo seu conhecimento e competência, tendo em vista esta Comarca ser um grande laboratório jurídico. Tenha certeza de que poderá contar com o apoio e incentivo do Promotor de Justiça, da Defensoria Pública, dos competentes serventuários e, principalmente dos competentes advogados militantes na Comarca. Tenho certeza de que a Cidade e Comarca de Monte Sião, carinhosamente por mim apelidada de Reino Encantado, e terá com o tempo o reconhecimento de que aqui se trata de uma cidade diferenciada. Uma especial recomendação: cuide bem de minha família forense, pois é com ela que passará a maior parte de seu tempo e dela dependerá da colaboração para o sucesso em sua jornada por este Reino Encantado.

À Defensoria Pública meu reconhecimento pelo comprometimento com a defesa dos assistidos, cumprindo a missão da Defensoria de ser a voz de quem não tem voz.

Aos serventuários, minha família forense montesionense, meu reconhecimento e minha gratidão. Vocês foram, com certeza, o meu esteio durante minha permanência como Juiz titular da Comarca. Aprendi mais do que ensinei, tendo em vista a excelência de seus conhecimentos. Vestiram, incondicionalmente a ‘minha camisa’ e sempre estiveram à minha disposição para qualquer necessidade da atividade judicante. Foram leais e solidários para comigo, e tenho certeza de que nunca os desmereci e sempre fiz questão de valorizá-los. O que sei, boa parte dele é culpa de vocês. A exemplo dos serventuários de Guaranésia, Guaxupé, tenho por vocês uma redobrada consideração e amizade e estou sempre à disposição no que for preciso. Meu eterno reconhecimento.

Aos advogados militantes na Comarca também são corresponsáveis pelo aprimoramento de meu conhecimento, pois como disse agora pouco, felizes dos senhores por trabalharem numa Comarca tida por verdadeiro laboratório jurídico, Comarca difícil e trabalhosa devido a sua localização geográfica, e ter uma economia pujante em razão de sua vocação para a produção de malhas e conhecida em todo Brasil como a Capital das Malhas.

Agradeço a todas as demais autoridades envolvidas nesta homenagem, tanto do Executivo quanto do Legislativo. Estes agradecimentos são extensivos, também, a todos os membros da família forense de Monte Sião, por esta iniciativa, que me tocou profundamente.

Um reconhecimento especial ao ex escrivão João Bueno, pessoa carismática e que me adotou juntamente com sua esposa. Meus sinceros agradecimentos. Do mesmo sentir meu reconhecimento aos serventuários aposentados o Sr. Antônio Pedro Mussi, Rowilson Tavares da Silva, Luiz Ludgero de Oliveira.

E uma homenagem póstuma ao decano dos advogados, o saudoso Dr. Manoel Otaviano que, em nome de sua filha, a Doutora Elizandra Otaviano, deixo explícito o meu carinho e saudade eterna.

Ao povo deste Reino Encantado que me acolheu de braços abertos (nem tanto), mas que teve em mim um admirador pelo estilo de vida, de atividade; um admirador pela beleza única e não encontrada similar no Estado, mas que aos poucos sentiram o meu compromisso de prestar uma atividade jurisdicional imbuído da melhor intenção de distribuir justiça.

No entanto tive que decidir inúmeras ações complexas e que de certa forma, qualquer que fora a decisão, mexia com os nervos, com as expectativas dos cidadãos, despertavam embates nas rodas de conversas, decisões por um tanto elogiadas e por outro tanto criticadas. Difícil exercer a atividade jurisdicional. Mas aprendi.

Pois bem!

Recordar é preciso, ainda que a vôo de pássaro.

Natural de Itapeva/MG, nasci em 10/03/54. Nasci na roça e de seis irmãos, sou o mais velho. Não renego minha origem de ter nascido na roça, de ter tirado leite, de ter pego no cabo da enxada, de ter pisado descalço no orvalho, porque sequer tinha uma alpargata para calçar, tudo isso ainda como criança. Meus pais, roceiros, me puseram para estudar na escola da cidade, naquela época não havia escola na zona rural, então tive que morar com minha avó Elisa. Na condição de aluno, sofri bulling e discriminação por parte de colegas em razão de minha origem e pobreza.

Para me manter nos estudos vendi sorvetes e engraxei sapatos. A pobreza doía, mas não tanto quanto ser humilhado pelos colegas de escola ao deparar-me pelas ruas vendendo sorvetes e engraxando sapatos. Meus pais, depois de amealharem algum recurso financeiro, adquiriram um bar na cidade de Itapeva, onde eu, com meus 10, 11 anos de idade (a sina do filho mais velho), como é ruim ser o filho mais velho, tinha que ajudar na confecção de sorvetes e no atendimento no balcão, muitas vezes trabalhando até de madrugada.

Com esforços sobrenaturais, ludibriando a pobreza, o bullyng, a indiferença, os obstáculos impostos pela vida, logrei formar-me professor na Faculdade de Varginha, formando em Matemática e Física. Assim lecionei matemática e física por 10 anos e por outros 10 anos fui Diretor de Escola.

Na condição de diretor de escola em Itapeva desenvolvi trabalho contra evasão escolar fazendo com que no município de Itapeva não ficasse uma criança sequer sem frequentar as aulas, e, por conta deste projeto tivemos os primeiros pais no estado de Minas Gerais processados por abandono intelectual, o que rendeu reportagens em toda grande mídia escrita e televisiva, assim como premiado pela Abrink, etc.

Com meus 38 anos de idade, o professor e diretor de escola percebeu que no magistério não teria mais espaço para crescer, embora tivesse sede de expandir nas fronteiras do conhecimento. Foi nestas circunstâncias que resolvi cursar Direito, com o objetivo único de ser Juiz de Direito. Depois de bacharelar-me em Direito com 43 anos, inscrevi-me na Ordem dos Advogados do Brasil, atuando num período de dois anos. Prestei meu primeiro concurso para magistratura em Minas Gerais em 1986 logrando ser aprovado.

Minha primeira Comarca, como juiz titular, foi a de Guaranésia-MG, onde permaneci por volta de nove anos, ocasião em que atuei como juiz colaborador nas varas de Guaxupé.

Posteriormente, aqui em Monte Sião, aportei-me e por sete anos exerci a judicatura como juiz titular da Comarca. Sete anos de muito trabalho, de muito aprendizado, e muito feliz.

A minha dedicação à Comarca de Monte Sião não é um favor, mas um mérito conquistado. Esta Comarca cintila no universo jurídico das Minas Gerais como um de seus luzeiros. Sua importância econômica, demográfica, geográfica e sobretudo, seu enorme destaque intelectual dão-lhe proeminência e requestam devotamento. Prometo-lhes perseverar na especial devoção de cuidado que tenho com vocês, é dizer, prometo-lhes o contínuo cometimento de cantar em versos e prosa a sua importância. Isso é um dever que me vem do ofício. Prometo-lhes guardar no peito o gesto generoso da outorga com que me honraram. Isso é um dever que me vem do coração.

Pretendendo preparar-me para a aposentadoria fui promovido para a 1ª Vara Civil e Infância e Juventude da Comarca de Guaxupé em 2013.

Aí está, meus amigos, um resumo desses anos de vida e trabalho. O que fiz nestes anos todo?

Fiz muitos amigos. Sou de fazer amigos e de conservá-los. Posso dizer com orgulho que fiz, nesses anos, uma legião de amigos, esforçando-me por mantê-los. Os amigos são como as plantas. Precisam ser regadas. Essa é uma sentença líquida, em sentido metafórico e literal.

Vou terminar.

As sensações e alegrias que são únicas na vida. Ainda que muito tempo se passe e muitas ocasiões de felicidade sejam vivenciadas. Ser agraciado com tão importante honraria é uma delas. Por isso, eu não saberia traduzir fielmente este momento de festa em meu coração. Recebo esta medalha em meu nome, mas compartilho-a, em forma de agradecimentos, com inúmeras pessoas, pois elas me possibilitaram aqui estar nesta noite e estão junto a mim nesta caminhada, dentre elas minha esposa, meus serventuários de Guaranésia, Monte Sião e Guaxupé. Aos Promotores de Justiça com quem atuei e muito aprendi, sendo eles Dr. Cláudio Marins, Marco Antônio Meikein, e aos Advogados de modo geral.

Enfim, quem recebe a Medalha Hélio Costa naturalmente sente-se mais valorizado e reconhecido por seus trabalhos voltados à comunidade. Por isso, vejo-me impelido, neste momento, a realçar razões que fazem com que essa homenagem seja para mim tão cara e tão honrosa.

Mas de maneira especial, tudo o que consegui foi pela fé, pois colocava Deus na frente e com muito esforço e dedicação as portas foram se abrindo, era Deus agindo.

Somente pela educação é possível transformar a realidade, diminuir desigualdades e emancipar pessoas!!! Foi assim com este magistrado e eterno aprendiz. Como cantou Milton Nascimento: ‘mas é preciso ter manhã, é preciso ter graça, é preciso ter sonho sempre... quem traz na pele essa marca, possui a estranha mania de ter fé na vida!’ Sigamos em frente! Agradeço a todos os meus familiares e amigos aqui presentes, física e espiritualmente.

Saberei levar em meu coração, pelo resto da minha vida, a gratidão pelo carinho, reconhecimento por esta homenagem que adorna, alimenta e revigora meus sentimentos de cidadania.

Em meu nome, recebam o meu muito obrigado. Nossa Senhora da Medalha Milagrosa, a padroeira deste Reino Encantado haverá, sempre, de proteger a todos.

Para terminar, em que pese ter faltado com a minha palavra de que seria um curto discurso, quero afirmar, em alto e bom som, que num espaço exíguo de meu corpo, o meu coração, que esta Casa da Justiça e Monte Sião, reside, agora e sempre. Muito Obrigado.

Monte Sião, 06/12/19.

Milton Biagioni Furquim

Juiz de Direito

Milton Furquim
Enviado por Milton Furquim em 16/09/2022
Código do texto: T7607013
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