A MALDIÇÃO DO CANIVETE

Meu nome é Elie, sou inglesa, porém minha mãe é brasileira, por isso, quase sempre estamos no Brasil passando as férias e visitando alguns familiares. Eu, particularmente, adoro os lugares fantásticos e as comidas oferecidas neste país. Bem recentemente, tive a oportunidade de viajar sozinha, foi uma experiência maravilhosa.

Aproveitei para conhecer Salvador. Estava no aeroporto na perspectiva de chegar logo ao meu destino. Felicíssima e ansiosa para reencontrar alguns amigos. Fui em direção ao lugar onde verificam a bagagem. A bolsa passou pelo raio x enquanto eu recolhia minhas outras coisas. Notei que seguraram minha mochila. O cara da segurança veio até a mim e perguntou:

- Moça, essa mochila te pertence?

- Sim! – Respondi já desconfiada.

- Parece que tem um canivete dentro dela. – Falou espantado.

Eu toda confusa, respondi com uma pergunta:

- Mas, o que seria um canivete?

Ele riu e repetiu:

- Um canivete! – Em alto e bom som, como se fosse óbvio para mim.

Todavia, eu não sabia o significado em português. Pedi para traduzir para o inglês. Porém, o infeliz não falava inglês. Tentou fazer umas mímicas com as mãos e subia e descia, sem sucesso. Após minha paciência ter se esgotado, eu simplesmente, peguei meu celular fui no tradutor e digitei, apareceu “A SWITCH BLADE”. Uma imagem de uma faquinha surgiu e mostrei para ele, sem crer que aquilo estaria realmente em minha mochila. O rapaz confirmou e pediu para dar uma olhadinha em minha bolsa. Fiquei apavorada:

- Mas moço, claro que isto não me pertence. – Falei na esperança de convencê-lo do contrário. A mochila estava amarrotada de roupas. – Vou logo avisando que está meio complicado mexer aí dentro.

- Sem problemas! - Surpreendeu-se com o volume das roupas que consegui enfiar nela. Pediu com licença e começou a procurar.

Eu de boa achando que ele estaria perdendo o tempo dele. Claro que não tinha um canivete ali, né!! De repente, lá vem ele com um canivete na mão e eu fui logo explicando:

- Moço, a mochila não é minha, é emprestada. - Comecei a tremer, a adrenalina lá em cima. - Peguei emprestada com meu tio, é a mesma que ele leva para acampar. – Argumentei com a verdade.

- Calma, de onde você é? Perguntou.

- Da Inglaterra. - expliquei um pouco.

Mediu o canivete e falou:

- Está no tamanho padrão, Pode levar, tranquilamente. - Disse com um sorriso no rosto.

- Não quero, pode jogar fora. Afinal, não é meu e não irá fazer falta. - Ele riu e colocou de volta na minha bolsa.

Reorganizei tudo novamente, agradecendo a Deus por ter dado tudo certo. Fiquei tão desnorteada que quando fui procurar meu portão de embarque, ouvi meu nome no alto falante avisando que era a última chamada. Corri o mais rápido que pude para não perder o voo. Foi por pouco!

Dentro do avião, enviei mensagens para minha mãe e meu tio falando sobre o ocorrido. Eles levaram um susto. Ele tinha certeza que havia limpado a mochila, não imaginava nunca que houvesse deixado um canivete ali dentro. E minha mãe chocada sem acreditar que deixaram eu entrar com um canivete e que existia um padrão. Pois, é, nem eu mesma pude acreditar.

[...]

Passados alguns dias...

Último dia na ilha Morro de São Paulo. Ao anoitecer, após o jantar, eu e um dos meus amigos, combinamos de largar o bendito canivete em algum lugar na praia. Estava chuviscando e algumas pessoas festejando na orla. Eu e Jony decidimos que aquele seria o momento perfeito para nosso plano. Pegamos a sombrinha grande do hotel, e seguimos em direção à praia. Pisamos na areia branquinha e nos afastamos um pouco, não havia ninguém, apenas umas pessoas na calçada festejando na maior animação. Mesmo assim, tivemos olhares curiosos nos olhando. "O que dois jovens estão fazendo na beira da praia, em plena noite de neblina?” – Alguém perguntou. Olhamos desconfiados e confesso que fiquei um pouco envergonhada. E assim fomos nos afastando mais, o suficiente para o que pretendíamos fazer.

Nossa, bateu uma tristeza, pois aquele canivete foi muito útil durante nossa estadia no hotel, serviu principalmente para abrir as latas de conservas, doces, e bebidas, enfim, mil e uma utilidades.

- E agora, o que faremos? – Perguntou Jony.

- Vamos nos despedir de maneira adequada. – Em seguida recitei algumas palavras de despedida. – Obrigada por tudo querido canivete. Você foi bastante útil para nós. Sentiremos sua falta. – E assim aconteceu como se estivéssemos num enterro.

Olhei bem de perto para ele e vi que era todo trabalhado, com desenhos do sol e da lua. Sua ponta brilhava em contraste com a lua daquela noite. Senti levemente um arrepio. Riscamos o desenho da lua na areia com o canivete. Jony, jogou-o a uns 50 metros na água. Tivemos a impressão de termos ouvido um choro e depois veio um momento de silêncio.

Voltando para a calçadinha, todos estavam olhando para nós de forma bem espantada.

Falei bem baixinho:

- Acho que devem estar pensando que somos aquelas pessoas ricas que adoramos fazer rituais religiosos.

Saímos em direção ao hotel, e os olhares deles não paravam de nos seguir.

E entrando no quarto, reparei algo brilhando no chão, bem ofuscante. Aproximei-me e quase cai durinha. O canivete que acabamos de jogar fora, estava ali em meu quarto.

- JONY!!!!! – Gritei e desmaiei.

DÉBORA ORIENTE

Debora Oriente
Enviado por Debora Oriente em 09/10/2022
Reeditado em 16/03/2024
Código do texto: T7623920
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