O fim da relação

Se ontem foi e a despedida de dois colegas meus que trabalham na biblioteca aqui perto de casa (passagem curta, porém marcante) com uma festa e honras mais do que merecidas, eu também, sem querer, acabei tendo uma despedida, só que em tom de funeral.

Confesso que não afeito a sentimentalismos e afetividades, mas com essa pessoa a coisa era diferente.

Longe de qualquer sentimento de amor ou paixão, mas muito longe mesmo, bem longe disso, eu possuía um certo sentimento de fraternidade por ela, tipo uma relação de um irmão mais velho com sua irmã mais nova, entende?

Conheci ela em 2015 em um curso de escrita criativa, onde descobri que era escritor sem saber que era escritor(pelo menos eu acho). Fui muito bem recebido por todos os colegas de curso, especialmente por ela e nós sabemos quando uma pessoa está sendo verdadeira ou não contigo, e assim nasceu nossa amizade e se desenvolvendo, superando os muros do centro cultural e da internet.

Para o bem e para o mal o tempo passa (tenho dificuldade em entender isso), e tudo nessa vida tem um fim, inclusive o curso e as pessoas vão tomando diferentes caminhos. Continuei na literatura, ela resolveu ir para o teatro e depois aderiu a vida de ativista política. Fiz o caminho inverso.

As circunstâncias foram acontecendo, fomos sendo transformados e nos afastando. O que era uma amizade verdadeira, tornou-se uma amizade fria e distante, restrito a pequenas mensagens como "Oi, tudo bem? Sim, e você? Que bom, abraços".

Depois de algum tempo, nem isso mais ocorreu.

Troquei de celular e perdi o contato, voltando a encontrá-la nas redes sociais muito tempo depois, mas aí já era tarde demais , pois já não era aquela menina que conheci e nem eu era mais aquele Fabio. Foi pura perda de tempo procurá-la.

Aquela menina educada, sensível (até demais), companheira em todos os momentos, tornou-se uma militante fria, insensível, intolerante e radical, a tal ponto de ser impossível qualquer tipo de diálogo, fora as pautas que passou a defender, totalmente contrário aos meus princípios e valores.

Demorou para eu me ligar, para variar, mas percebi que o mundo dela agora era outro e nesse seu novo mundo, não há lugar para mim. A recíproca também foi verdadeira: Em minha vida ela não cabe mais. Tirei-a dos meus contatos, terminando nossa amizade em definitivo. Fiz isso com uma certa tristeza, confesso, relutando dentro de mim para não tomar esse tipo de atitude, mas a vida muitas vezes nos obriga a tomar certas decisões que não gostaríamos de fazer, porém são necessárias.

Para terminar essa crônica que já está longa demais, o enterro foi ontem e agora que cada um siga seu caminho, restando somente deixar o tempo apagar o defunto da memória, tudo isso graças a polarização política tomou conta de todas as áreas de nossas vidas, gerando mortes, inclusive de grandes e longas amizades.

(2022)