Impressões sobre "O diário de Natal"

É preciso perdoar, é preciso descongelar aquele gelo arraigado, que se forma das lembranças mais secas. É preciso deixar a umidade desbastar as estalactites do remorso e da acidez.

Um diário de uma mãe que, infelizmente, é forçada a deixar a filha que espera para trás. A filha que lê as palavras da mãe, no diário. Uma família esgarçada por uma perda. Depois de 30 e tal anos as palavras remontam a vida de pessoas que talvez só precisassem de descongelar palavras enterradas consciente ou inconscientemente no Polo Norte do coração.

Uma pelicula banal, numa tarde em que as perguntas se acumulam há algum tempo na traqueia do dicionário. Esse filme trouxe a saudade do que não foi pronunciado adequadamente, arrependimento das palavras ditas adequadamente, mas sem necessidade, e saudade de tudo adequadamente pontilhado com a ausência de palavras.

Uma tarde medíocre, você pode pensar. Que tolice. Não. Não mesmo.

Quando um filme traz uma boa escrita, por mais mamão com açúcar que seja, faz a gente conceber pipoca e tempo para deleitar minutos com este. E se você gosta de polifonia, pode ir acrescentando palavras, frases, textos, epígrafes inteiras, livros aos quais teve acesso.

De modo que um filme banal, rememora o último texto estudado sobre Constelação Familiar e reconciliações do Bert Hellinger, naquela parte que ele diz que "a reconciliação começa em nossa alma. Quando o que quer que seja que rejeitamos, ou do qual temos vergonha é reconhecido e mesmo amado, então nós podemos nos tornar mais completos e em paz."

Com sorte, se você é leitor solitário, ou não, pode fazer link com o livro “A raridade das coisas banais” de Pedro Chagas Freitas e lembrará algumas falas do Zambé; sobre crescer, sobre amar, sobre perder. Mas sobretudo, sobre ter esperança.

E ultimamente, ter esperança é o que tem feito mais falta. Ter esperança é o que tem gerado mais força aos nossos espíritos sequiosos de filmes onde aconteçam muitos encontros para tomar café, para assistir películas no Cinema, para falar sobre escrita e leitura de livros literários e diários, para reler cartas datadas com carimbo e tudo, com envelopes e tudo…

Ter esperança é o que nossa essência tem tido necessidade… esperança em finais felizes.

Você pode estar maneando negativamente a cabeça para meu texto, dizendo que sou muito bobinha em pleno 2022. Mas prefiro ouvir Zambé e aconselho-te a ouvir também (ou ler):

“_ Vamos voar até aquela árvore?

– Não consigo anadar agora.

– E quem disse que é preciso andar para voar?”

Solineide Maria

Luanda, 28 de Novembro de 2022

Solineide Maria
Enviado por Solineide Maria em 28/11/2022
Código do texto: T7659844
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