UM CAUSO E REFLEXÕES: RELACIONAMENTOS E INFIDELIDADES

Oi!!

Vamos refletir um pouco sobre afetividade, relacionamentos e infidelidade?

Todos queremos – salvo exceções - que nossa história amorosa tenha desfecho positivo. Mas, mesmo nos preparando para fazer as coisas da melhora forma, somos passíveis de erros, e de vivenciar experiências sofridas em relacionamentos.

No contexto afetico, há várias formas de agir contra o que nós mesmo acreditamos ser o correto, ou fomos ensinados a ver como o correto, e nem sempre devemos nos culpar, salvo em relação àqueles erros em que fizemos um mal deliberado, arquitetado e de forma maliciosa a alguém.

Na vida afetiva, muitos deslizes não são cometidos na maldade, como a gente pensa. Um dos exemplos mais clássicos de erros ou quebra de acordos nas relações, a traição, na maioria das vezes, sim, na grande maioria das vezes, acontece em contexto em que a pessoa que trai se sente confusa se está gostando ou não da outra pessoa, ou seja, da/o amante. A pessoa que trai pode sofrer com a ambiguidade de estar gostando de outro alguém e por outro lado, por estar traindo votos de fidelidade.

Muitas traições podem ser explicadas (não justificadas?) pelo fato de um namoro/casamento estar passando por fase de muitos problemas. Justifica a traição? Não. Mas, é muito simplista condenar/criticar erros afetivos em quebra de contrato de casal. Afinal, conhecemos nossos sentimentos, mas, dominamos mesmo como achamos que dominamos? Nossos desejos? Nossos instintos?

Pois bem. Era uma vez João e Maria; João e Maria se conheceram e começaram a se relacionar, vindo cada qual com sua história pregressa afetiva. João vinha de um passado “muito certinho”. Dois namoros sem nunca ter traído, zelava por uma imagem boa nas relações. Já Maria, por outro lado, vinha de uma história pregressa “não tão zelosa” assim, tendo inclusive tentado esconder seus feitos afetivo/sexuais de seus pais, por divergências de valores.

João ao saber da história de Maria, titubeou. Recuou um pouco, não quis formalizar a relação; Recuou para conhecer mais e saber se não estava se envolvendo com alguém que brincava em relacionamento. Até formalizar o namoro, foram quase 7 meses.

Namoraram e enfim se casaram. No trajeto de vários anos juntos, adivinhe quem traiu quem? Quem tinha um histórico “mais certinho” antes do namoro. Não terminaram, mas, Maria teve que passar por um processo de elaboração, não sem sofrimentos. João traiu por distração, por brincar? Não. Traiu por estar realmente na época gostando de uma pessoa e no casamento a fase não era positiva (descrevo mais abaixo).

- Mas João, não era uma paixão?

- Não.

Tanto não é que a pessoa com quem João traiu a esposa ainda desperta nele sentimentos afetivos, gera sofrimento ao ser lembrada; e ela sofre por não ter sido possível ir adiante com João. Porque João teve que escolher. Ah sim, no mínimo há pressões sociais que são internalizadas para que se chegue a uma escolha, não é? Temos que fazer escolhas, e digamos que, pensando em regras socias, seja justo, se o que está em jogo são sentimentos de uma pessoa com quem acordos de fidelidade haviam sido firmados.

Antes da traição, o casal já vinha de um momento muito, muito delicado mesmo na relação. Sabe um dos maiores problemas? Sabe aquela coisa, de um gostar mais do que o outro de vida social? Não se identificou ne! João gosta, Maria não gosta. João se envolvia em muita coisa; se sentava numa mesa com outras pessoas, seja em um café, bar, evento ou em show, podia ficar horas conversando. E fazia bem a ele conversar sobre muita coisa: política, futebol, música, comida, filmes, viagens, pessoas, coisas do cotidiano, religião, relacionamentos e afins... Já Maria não tinha tal perfil. E não era alguém alienada na vida. Era estudada, bom roteiro profissional ao longo da vida, etc.

No início do relacionamento a coisa fluiu. Mas com o tempo, os combinados que funcionavam, pararam de funcionar; as conversas foram raleando; ela não gostava tanto de sair com João, e ele evitava sair sem ela, assegurando a administração do ciúme que a esposa apresentava. Mas para ela estava bom, pois, ele foi quem aderiu. Aderiu, mas, não estava feliz. Tentavam refazer combinados, mas, não estavam sendo efetivos, pois uma coisa já estava afetada: o afeto! Aí, numa quase caminhada para separação, conversavam já sobre, veio paralelamente a traição, em que João acabou ficando com Marta.

E foi erro. Não? Por que não concluir a separação primeiro, sendo justo?

Mas no caso, João falou para ela? Não! A esposa ficou sabendo por “descuido” dele. Homem é ruim para esconder situações do tipo ne.

João, que já tinha falado para a Marta que não iriam mais se relacionar até ele resolver sua situação no casamento, foi pego pela esposa em pistas deixadas aleatoriamente. Mas, aí ao invés de pedir separação, Maria pediu para tentar. Agora que via que perdia o casamento por um risco externo, resolveu que isso é que teria influenciado a crise no casamento. E não foi. Apesar do orgulho ferido, de tudo favorecer para uma separação com a coisa pendendo a seu favor, descobriu que gostava de João. Bom, há outras possibilidades explicativas, que podemos ver em Bauman (livro: Amor líquido). Mas fiquemos com esta consideração.

João apontava que não dava mais. Entraram em processo de reflexão, avaliação de pós e contras, avaliação do afeto, da relação, etc. Lembro, e ainda não mencionado, que houve “pequenas traições”, não de ordem afetivas, mas de outra natureza, por parte de Maria. Financeira principalmente, o que afetou alguns planos no próprio casamento, como a parte de ter filhos e finalizar a compra definitiva da casa - na época. João perdeu a confiança em Maria como parceira, pois, ela se meteu em dívidas para metas pessoais...

Ok, resolveram muitas das diferenças. Resolveram tentar salvar o casamento. O filho veio quando a situação ainda não estava muito boa. E depois do filho, que não foi planejado, ficou a sensação de que salvar o casamento era uma causa necessária.

Mas e Marta, pessoa que ainda mexe afetivamente com João? E Marta que sofreu durante muito tempo ainda, frustrada com a situação? E será que João e Marta, dois traidores de contratos sociais tão caros, pensavam assim? “ah, tô nem aí pra Maria, eu quero é ser feliz e sentir o prazer de uma paixão!”. Cuidado caro leitor, cuidado em não ser descoberto em atitudes parecidas, ou, frustrações reprimidas, ou pelo fato de simplesmente não ter sido tentado assim, por afetos e desejos.

Mas, nessa história, Maria também sofreu. João sofreu. Marta sofreu. Aí que está a questão. Devemos ter muito cuidado na administração da área afetiva. Sim, vamos usar termos mais técnicos mesmo: gerenciamento e administração da vida afetiva. Triângulo amoroso quase sempre produz situação de sofrimento, exceto quando consentido pelas partes ne.

Para fazer dar certo um relacionamento duradouro, deve haver investimento; o clichê “não pode deixar esfriar” ao ponto de que uma das partes encontre em outra pessoa novas expectativas, pode parecer desculpa, justificativa oportunista, mas, sim, é parte que influencia.

Concordemos ou não, mas, busquemos entender mais o ser humano pelo lado dos desejos, e descobriremos que mesmo amando alguém podemos trair. Oh, que elaboração não romântica, não é?. Mesmo amando o seu par, uma pessoa poder trair? Ok, estarão sim, sendo quebradas REGRAS SOCIAIS, mas, desejos, sentimentos, sentir atração e afins, são condições tão intensas e influentes quanto regras sociais. O que controla que essa intensidade não se transforme em traição são fatores como: punição perante julgamento da sociedade, valores pessoais, empatia pela pessoa que já estava na relação, respeito a um contrato firmado, medo de perder um amor/história afetiva por um não gerenciamento de sentimentos/desejos intensos, medo de perder vantagens de uma vida relacional formalizada em namoro ou casamento, enfim, conjuntos que representam ao final uma necessidade de autorepressão...

Ah, e não adianta SÓ nos guiarmos pela nossa consciência. No contexto de traição tem o corpo atuante: betaendorfina, adrenalina, serotonina, noradrenalina, dopamina, corticoides, hormônios, órgãos sensoriais... todos atuando, e de forma autônoma, sem nosso consentimento.

E qual a perspectiva do casamento de João e Maria? Pode durar para sempre, até por que na questão moral, ambos tendem ao conservadorismo. Mas se acabar, agora eles têm ciência de que será mais por influência de fatores internos (e sim, afetará o filho, não adianta inventarmos discurso alternativo quanto ao impacto; o que dá para fazer é gerir situações que diminuam o impacto).

Por fim, o que dizer sobre afetividades? Claro que aqui tem a subjetividade do autor, mas, leiamos Bauman, Foucault, Freud, pesquisas sobre laços conjugais, monoteísmo, leiamos a vida como ela é, leiamos os números relativos a divórcios e traições. Saíamos do que acreditamos e queremos fazer dar certo para uma busca de conhecimento sobre como funciona o ser humano no contexto afetivo, instintivo, sexual, neuronal, sentimental, e tiremos algumas conclusões...

Afetividades: algo muito sério, muito intenso; provavelmente a área que mais leva pessoas a procurar psicoterapia, fator precipitante que mais leva pessoas a tentar autoextermínio (lógico, em contexto negativo); que leva a ter sintomas depressivos; afeta várias outras áreas. Ainda assim, pensando pelo lado positivo, pela necessidade que temos de afetos, pode ser considerada uma das propriedades mais bonitas no ser humano; que se possível, não deve ser evitada (quem conseguirá a sublimação? - termo na psicanálise).

De tudo isso, considera-se, com respeito ao contraditório, que devemos julgar menos quando ouvirmos histórias que não deram certo, ou histórias em que, ao simples olhar de regras sociais, acusam-se erros de um enamorado/cônjuge. Salvo, como já dito mais acima, que caiba a reflexão sim, quando as ações e escolhas de uma pessoa trouxeram consequências prejudiciais a outrem, tendo sido planejadas de forma muito premeditada e maldosa, tão somente irresponsável.

É mérito, e devemos buscar sempre, fazer um relacionamento dar certo.

Nem sempre é demérito, quando houver desvio de rota, ou que acabe em dissolução de laços.