O vaga-lume

O despertador do celular tocou. Acordei. Levantei e fui desativá-lo. Havia um pequeno besouro pousado nele. O espantei e ele saiu voando iluminado. Era um vaga-lume.

Notei que a bateria do celular estava acabando e o coloquei para recarregar até a hora de sair para trabalhar. Trinta minutos deveriam ser suficientes para que a carga da bateria atingisse um nível que durasse até a hora do almoço, quando eu a completaria.

Nesse momento fui ver quantas horas eram. Ainda faltavam três horas para o horário que eu havia programado o despertador do celular. Achei estranho, mas voltei para a cama, programei o despertador da televisão, virei para o canto e dormi.

Quando a televisão ligou, levantei-me e constatei que, agora sim, eu havia acordado na hora certa. Pensei que após três horas a bateria do celular certamente estivesse completa. Fui verificar. Novamente o vaga-lume estava em cima do celular. O espantei, ele saiu voando. Peguei o celular. Para minha surpresa, ele continuava com a carga baixa, não dava para levá-lo assim para o trabalho. Voltei a colocá-lo para recarregar, só que desta vez em outra tomada, aquela provavelmente não estava funcionando. Fui trabalhar.

Na hora do almoço, fui outra vez verificar a bateria do celular. Mais uma vez me deparei com o vaga-lume sobre ele. O espantei, ele voou. No entanto, agora todo o seu corpo brilhava, uma luminosidade tão intensa que podia ser notada em plena luz do dia. Esse não poderia ser de maneira alguma um vaga-lume comum. Eu nunca havia visto um que emitisse luz de todo o corpo, nem com tanta intensidade.

Novamente a bateria do celular não havia sido recarregada. Nem um pouco. Aquela criatura estava, de alguma forma, absorvendo a energia dele. O vaga-lume saiu voando pela janela do meu quarto.

Alguns dias se passaram. Comentei o ocorrido com meus familiares. O que ouvi foi que eu estava louco, ou que havia tido um sonho maluco que, por ter sido muito realista, me deixou impressionado. Tentei acreditar na ideia do sonho, mas minha cabeça não deixava.

Resolvi procurar um psiquiatra. Marquei uma consulta. O médico, após ouvir minha história, este pelo menos sem rir, diagnosticou uma mania de perseguição, um tanto quanto paranoica e me receitou um medicamento, o qual, disse ele, era apenas um “medicamentozinho light”, só para me ajudar a lidar com a situação. Tarja preta, mas bem tranquilo.

Mesmo não gostando muito da ideia, resolvi tirar a prova e comecei a tomar o tal remédio. Passei a, quando saía de casa, trancar a porta olhando para os dois lados para ver se alguém me observava e conferia várias vezes se a porta estava bem fechada. Na rua, ficava olhando para trás o tempo todo, pensando que estava sendo seguido por alguém. Qualquer pessoa que me olhasse ou andasse atrás de mim por mais de dez segundos já ouvia um grito: “– O que você quer comigo?”. Isso nunca havia me acontecido antes.

Decidi parar de tomar o medicamento. Passadas algumas semanas, o efeito colateral do remédio desapareceu e minha vida voltou ao normal. Agora sim eu sabia o que era mania de perseguição. Uma coisa horrível. Não queria passar por aquilo nunca mais. Eu não estava louco, nem queria ficar. Não podia ficar dando ouvido a essas pessoas, senão iria acabar ficando.

Eu já estava trabalhando a ideia de que o ocorrido não passara de um sonho lúcido ultrarrealístico, mas ainda queria descobrir o que realmente havia acontecido naquele dia. Aquilo havia sido muito estranho. Aquele vaga-lume não saía da minha cabeça. Foi então que ele saiu. Literalmente saiu pelo meu ouvido e voou pela janela afora para nunca mais voltar.

Chamei um eletricista para dar uma olhada nas instalações elétricas daquele velho apartamento. Um curto-circuito provocado por uma infiltração na parede próxima ao banheiro havia queimado quase todos os fios elétricos que levavam energia para as tomadas, só a da televisão e os apagadores das luzes haviam escapado. Notei que a lâmpada que ficava acima da minha cama era tão forte que me fazia enxergar um ponto luminoso por algum tempo.

Aquele remédio realmente havia funcionado.

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