DOIS CHEQUES DE TRINTA
Uma pesquisa básica sobre os vícios de linguagem informa (a concordância aqui foi feita com a palavra “pesquisa”) que esses são alterações defeituosas que sofre a língua em sua pronúncia e escrita em virtude da ignorância do povo ou do descaso de alguns escritores.
Eles podem ser classificados como: barbarismo, ambiguidade ou anfibologia, cacofonia, eco, arcaísmo, vulgarismo, estrangeirismo, solecismo, obscuridade, hiato, colisão, neologismo, preciosismo, pleonasmo.
Essa crônica não quer ser uma aula de Português, mas quer abordar termos como: PODITAPAGANO, VÔTÁTRANSFERINU” e “VAITÁRECEBENU”. Apesar de parecerem nomes de elementos químicos, não são. Tratam-se de “pragas” linguísticas, inventadas por não sei quem, e amplamente utilizadas por pessoas que querem que os outros pensem que elas são cultas.
Antes de serem anomalias fonéticas, plenamente compreensíveis, esses termos são deveras irritantes porque são neologismos verbo-temporais. De certa forma, são sucedâneos de outras sandices: o “ANÍVEL DE”, o “EU, ENQUANTO...” e outro irritante “NA VERDADE”... Isso sem falar no ONDE, sem referir-se a lugar, e que, também, é um pé no saco!!
Acho que ao dizer PODITAPAGANO, o pessoal quer dizer PODE ESTAR PAGANDO. Bem, alguém pode até estar tendo (02 verbos) um derrame, um ataque cardíaco, mas uma conta, por exemplo, a pessoa jamais PODE ESTAR PAGANDO, viu?
Explico: temos dois futuros no modo indicativo: do presente (quando a primeira pessoa do singular termina com “–rei”: terei, transferirei, receberei...) e o do pretérito (quando a primeira pessoa do singular termina com “–ria”: teria, transferiria, receberia...). Detenhamo-nos apenas no futuro do presente. Isso não significa dizer que expressões como: “eu vou ter”, “eu vou transferir” e “eu vou receber” não estejam no futuro ou que sejam erradas, embora fosse bem melhor dizer: “eu terei”, “eu transferirei”, e “eu receberei”.
Temos também o gerúndio, uma forma nominal, que expressa ações que estejam acontecendo no momento. Sua terminação verbal é –NDO e normalmente ele é acompanhado por um verbo auxiliar: SER, ESTAR, CONTINUAR, FICAR, PARECER e ANDAR. Assim, o correto é dizer: estou transferindo, continuo transferindo, fico transferindo, ando transferindo...
Dizem que o VÔTÁTRANSFERINU” e o “VAITÁRECEBENU e similares têm origens no Inglês. Isso não é verdade, porque também nesse idioma o gerúndio expressa uma ação que esteja acontecendo no momento, é formado por dois verbos (é auxiliado pelo verbo TO BE e o verbo principal recebe – ING, guardadas as regras apropriadas para tal).
Então, pelo amor de Deus, toda vez que você estiver tendo o desejo de falar ou escrever usando três verbos seguidos e que o segundo deles seja o ESTAR, faça como aquele cara que não sabia preencher um cheque com o numeral “sessenta” e preferiu fazer dois de trinta. Em outras palavras, prefira dizer VOCÊ PODERÁ PAGAR (02 verbos) NO PRÓXIMO MÊS, a VOCE PODE ESTAR PAGANDO (03 verbos) NO PRÓXIMO MÊS.
Faça isso por amor a Deus e a você mesmo(a), porque a ignorância ou a insistência no erro, pode fazer com que pensem que você não sabe o correto e não sabe fazer algo muito simples: “dois de trinta”!