ISSO NINGUÉM MERECE

Sabe, nem todo dia é dia do caçador porque, também, tem o dia que é da caça.

Ontem não foi um dia bom para mim e nem sei dizer para quem também o foi.

Dez horas da manhã.

Fui à farmácia do posto de saúde resgatar meus contínuos antidiabéticos mas, para minha surpresa, lá me disseram que seria necessário trocar a receita por outra mais recente. Para tal providência retirei uma ficha com determinado número e fiquei por mais de meia hora olhando assiduamente se o tal número surgiria no monitor exposto na parede. Ao ser atendido me deram um formulário explicitando que eu voltasse antes das sete horas do dia seguinte para passar em consulta médica. Expliquei que minha saúde estava muito boa e que eu não precisava ocupar, desnecessariamente, o precioso tempo do médico com uma consulta e que eu só queria, apenas, uma nova receita para prosseguir com a minha medicação. Acrescentei que por várias vezes a tal receita foi entregue na minha residência por uma agente comunitária sem eu ter a necessidade de ser consultado. Mas a estúpida funcionária não me acatou e fiquei subordinado voltar no dia seguinte conforme a sua determinação.

No dia seguinte saí de casa no frio do amanhecer, bem próximo da beirada da madrugada para, bem apressado, ir passar em consulta médica. Chegando lá parei numa calçada inclinada de uma rua estreita e muito ventilada, onde senti um frio muito intenso. Entrei no final de uma fila da qual contei cerca de quinze pessoas na minha frente. Ai eu monologuei, me dizendo: - será que eles dormiram a noite toda de pés, aqui na calçada? O dia tardava a clarear e nem sinal do Sol aparecer para expulsar a neblina gelada. Eu estava bem protegido por uma máscara de pano preto a qual me deixava inidentificável por qualquer pessoa. Em pouco instante a fila humana já se alongava atrás de mim e eu supunha ter ela mais de trinta indivíduos.

Após longos minutos sob a intensa friagem, eis que a fila começa a se mover na direção da porta de entrada, e entrei. La dentro as pessoas pegavam a dita ficha contendo determinado número e ficavam atentas para os apitos do tal monitor pregado na parede, era como se estivessem à espera de um resultado de bingo, querendo ver surgir o número de sorte em suas fichas e poderem ser atendidas. Enquanto isso a agitação do entra e sai se tornava intensa no recinto à espera do tal atendimento protocolar que se resumia, simplesmente, em ser identificado e aguardar sentado à demoradas soluções.

Chegando a minha vez de ser atendido (já era oito horas e vinte minutos) fui direcionado para a mesma funcionária do dia anterior. Ela se fez de não me reconhecer e, após digitar algumas teclas no computador, ela me deu um formulário onde explicava que eu só passaria em consulta às quatorze horas e quinze minutos. Mais uma vez eu e ela voltamos a discutir sobre o mau atendimento que me submetiam. Não sendo bem acatado solicitei-lhe a gentileza de me dirigir a falar com o diretor do posto para solucionar o referido problema da obrigatoriedade de ter que, desnecessariamente, passar em consulta médica ocupando o tempo do profissional em atender alguém com maior necessidade.

Já era nove horas e vinte minutos quando me apareceu o tal diretor querendo resolver o assunto ali mesmo, no meio do povo. Me sentindo tal qual um Zé Ninguém eu lhe falei assim:

- É possível eu falar com o senhor no seu gabinete?

Ele percebendo o meu estado emocional, afirmativamente balançou a cabeça e me conduziu ao referido recinto. Lá nós nos sentamos e relatei tudo que era necessário dizer. Aproveitei o momento e solicitei a necessidade de manutenção nos bebedouros d`água dos recintos e de ter um relógio exposto ao público frequentador. Felizmente ele entendeu minha queixa e de pronto me conduziu ao consultório onde fui atendido prontamente pelo doutor.

A minha queixa sobre o mau-atendimento foi ouvida e alguma coisa foi modificada.

Todo meu sacrifício foi válido.

José Pedreira da Cruz
Enviado por José Pedreira da Cruz em 21/05/2023
Reeditado em 27/12/2023
Código do texto: T7793851
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