MENINO E MENINA

Ao pisar na sala de aula, Robson não resistiu e corou. Tímido que era, baixou a cabeça e foi procurar uma carteira para sentar-se. Ao perceber que a classe inteira olhava diretamente em sua direção, o menino arrumou uma maneira de se esconder mesmo sem sair do lugar. E foi ali, quase embaixo da mesa, que escutou o professor de História chamando pelo seu nome. Teve vontade de correr, é verdade, mas resistiu bravamente àquele impulso e resolveu responder ao chamado. Seus colegas de classe caíram na gargalhada ao escutar aquela voz fanha saindo de dentro de uma boca camuflada por um aparelho dental de dimensões gigantescas. O professor tentou repreender os alunos, mas nem ele conseguiu resistir e também caiu na gargalhada.

Depois daquela algazarra foi inevitável Robson passar a ser o centro de todas as gozações da sala. Em pouco tempo, sua fama se espalhou por toda escola e o garoto passou a ser o rosto mais conhecido do colégio. Mas tamanha fama, que poderia ser a glória para qualquer menino de 17 anos, obviamente foi um tormento para ele.

Com poucos amigos, Robson se isolava cada vez mais em seu mundo particular. A diretoria e os professores estranhavam aquele comportamento, mas a verdade é que todos sabiam que se tratava de um cavalão de 17 anos e, portanto, se ele quisesse ser assim e continuasse tirando boas notas, para eles estava tudo certo. Afinal, era ótimo para a imagem do colégio um aluno ter a chance de passar no vestibular com tamanha facilidade.

O tempo passou e a turma decidiu por uma viagem ao invés da tradicional festa de formatura. Iriam todos para Porto Seguro, na Bahia. Inclusive Robson, que foi convencido por seus poucos amigos de que aquela seria a chance de mudar a sua imagem. Mas para que isso pudesse acontecer, sua missão não seria nada fácil: Robson precisaria começar a beber, fumar, frequentar a noite e principalmente, conseguir um beijo de Ana. Loira, dona de um par de olhos verdes e um corpo escultural, a menina era, de longe, a mais desejada da classe.

Robson criou coragem e convenceu seus pais a pagarem sua viagem. Ainda no aeroporto, o garoto abriu a primeira cerveja de sua vida. Achou o gosto amargo, mas seus amigos não o deixaram desistir. No avião, foram mais três ou quatro e, chegando em Porto Seguro, ele já estava completamente bêbado. Seu primeiro porre.

Aos poucos o meninocomeçou a se enturmar com os colegas de sala e aceitou o convite para ir à primeira festa da viagem. Festa particular, no quarto 502. Foi lá que Robson acendeu o seu primeiro cigarro. Tossiu feito um cachorro, mas em pouco tempo já estava parecendo um legítimo garoto propaganda de comerciais do produto. Mudado e cheio de novos amigos, o menino não parava de beber. E foi assim que ele finalmente chegou ao seu primeiro vômito provocado pelo excesso de álcool.

Durante a semana foi sempre a mesma coisa. Robson era convidado para as festas, bebia, fumava e vez ou outra vomitava. O garoto estava radiante com sua nova vida, mas mesmo assim sabia que para ser verdadeiramente aceito naquela pequena sociedade, ele ainda não havia feito tudo o que precisava. Beijar na boca continuava sendo um tabu.

Talvez Ana se achasse bonita demais para os garotos do colégio ou então ninguém tivesse tido papo o suficiente para convencê-la do contrário, mas o fato é que a menina continuava sendo apenas um sonho para todos eles.

Cheio de confiança, agora que fazia parte da turma, Robson usou toda a sua inteligência para convencer a menina a dar um gole de seu “capeta”. Maravilhada com o sabor daquela bebida de nome estranho, Ana bebeu tanto que estava completamente fora de si quando finalmente foi convencida por Robson de que para agradecê-lo por apresentá-la às delícias da noite de Porto Seguro, ela deveria dar um beijo em sua boca.

É verdade que no dia seguinte Ana não fazia a menor idéia do que pudesse ter acontecido na noite anterior, mas com uma câmerda fotográfica em mãos, Robson tinha as provas de seu feito e, para os meninos, nada mais importava: aquele menino tímido, fanho e da boca de ferro acabava de ser alçado à condição de herói da turma. E quanto à Ana? Bem, depois daquela noite, a menina perdeu o encanto e já não era mais tudo aquilo.