Maria

Maria levantou pela manhã e se deparou com sua colega de quarto na cama ao lado.

— Bom dia. Minha filha não veio me buscar? Estranho, era para termos ido embora.

— É, eu sei você tinha vindo aqui apenas de visita.

— Então, por que fiquei aqui?

A outra virou os olhos. A enfermeira veio até o quarto chamar as duas. Separou as roupas delas e ajudou a companheira de Maria a se vestir, a colocou na cadeira de rodas.

— Maria, vou levar a Carmem lá embaixo e já passo aqui para te pegar.

– Quando a minha filha vem me buscar?

— Mais tarde ela vem.

A enfermeira voltou, ajudou ela a se vestir e foram para a mesa do café. Lá estava aquela idosa que só gritava, outra que também perguntava do filho, uma que só cantava, duas que não falavam coisa com coisa e outras duas em cadeira de roda. Essas eram lúcidas e tinham o ar triste.

Depois do café foram ao jardim tomar sol. Maria não parava um só minuto, ia atrás das enfermeiras e perguntava a todo momento como fazia para ir embora. Sempre perguntava da filha. Às vezes começava a falar com as outras dizendo que tinha ido visitar, que morava na Mooca e que o marido era despachante. Uma hora perguntou sobre sua bolsa. Deram para ela uma bolsa grande com uma blusa dentro e ela ficou andando com a bolsa a tiracolo.

Depois do almoço algumas foram para a sala de televisão, outras foram para a sala de pintura enquanto poucas recebiam visitas.

A filha de Maria veio vê-la.

— Oi, mãe, como a senhora está?

— Já faz tempo que estamos aqui. Vamos embora. Seu pai deve estar preocupado comigo.

A filha balançou a cabeça e seus olhos se encheram de lágrimas. Ela respirou fundo e respondeu:

— Não se preocupa, mãe. Ele sabe que a senhora está bem. Vai precisar ficar aqui mais um pouco, enquanto reformamos a casa.

— Não, quero ir embora.

Maria levantou e a filha foi atrás dela para traze-la de volta ao banco.

— Mãe, vem cá.

— É por pouco tempo.

— Tá. Mas depois eu volto. O João não gosta quando fico muito tempo longe de casa.

— Eu sei. Ah, olha como suas netas estão lindas...- disse mostrando a foto das filhas.

Terminado o horário de visita a filha foi embora chorando. A mãe morava com ela, mas não conseguia controlá-la. Ela roubava a chave de casa e fugia, mesmo quando escondia a chave ela achava. Queria voltar para sua casa na Mooca e seu marido. Mas a casa já não existia há muito tempo e o marido também não. A filha explicava, mas a mãe logo esquecia. A filha não conseguia ficar de olho nela porque trabalhava de home office. Pagar uma enfermeira sairia caro, mesmo porque precisaria uma para noite também.

Mas Maria não conseguia compreender. Assim que a filha foi embora voltou a perguntar dela, a andar com a bolsa a tiracolo e a falar com as outras sobre o seu marido despachante.

A noite chegou, o jantar, e por volta das dez da noite todas foram levadas para seus quartos. Não sem antes tomar um calmante para dormir. Mas Maria acordou no meio da madrugada e mesmo atordoada pelo remédio foi ao corredor, gritando que queria ir embora. A enfermeira da noite a levou de volta dizendo que sua filha viria no dia seguinte. Ela dormiu, ao acordar se deparou com sua colega de quarto e disse:

—Bom dia. Minha filha não veio me buscar? Estranho, era para termos ido embora.

AninhaP
Enviado por AninhaP em 12/07/2023
Reeditado em 12/07/2023
Código do texto: T7835131
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2023. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.